As demissões em massa promovidas pelo Itaú, atingindo centenas de trabalhadores em regime remoto, expõem uma ferida aberta nas relações de trabalho contemporâneas: até onde vai o poder das empresas de monitorar seus empregados no home office? E, sobretudo, qual é o limite entre a gestão legítima da produtividade e a invasão da privacidade?
O banco justificou os cortes alegando “padrões incompatíveis com os princípios de confiança”. Mas os critérios utilizados — registros digitais de uso de computador, cliques, abertura de abas — revelam um modelo de vigilância que coloca o trabalhador sob suspeita permanente. Não se trata mais de avaliar resultados, mas de transformar cada gesto em dado, cada pausa em indício de desleixo.
Do ponto de vista legal, a Consolidação das Leis do Trabalho e a LGPD oferecem parâmetros: a empresa pode monitorar, sim, mas deve respeitar a proporcionalidade, a finalidade e a transparência. O problema é que o discurso da “confiança” foi substituído pela lógica da punição, culminando em dispensas sumárias sem a devida gradação de penalidades — um claro desrespeito à boa-fé objetiva que deve reger as relações laborais.
O episódio também levanta uma questão sindical e social. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que demissões coletivas exigem participação prévia dos sindicatos. Não se trata de mera formalidade: é a proteção contra arbitrariedades que afetam centenas de famílias. O lucro bilionário do Itaú reforça a incoerência entre o discurso de eficiência e a realidade de cortes brutais.
O que está em jogo vai além do caso Itaú. O futuro do home office, que já se mostrou eficaz e vantajoso para empresas e trabalhadores, não pode ser pautado pelo medo ou pela vigilância desmedida. Cabe à sociedade, ao legislador e às entidades de classe debaterem: queremos um modelo de trabalho que valorize resultados e confiança, ou um sistema que transforma cada colaborador em suspeito em potencial?
O caso Itaú é um alerta. O avanço tecnológico deve servir para ampliar direitos e produtividade, não para retroceder em conquistas históricas de dignidade no trabalho.
ASMETRO-SI 11/9/2025
Fontes consultadas:
- Demissões no Itaú: trabalhador pode ser monitorado em home office? Qual o limite? Veja o que diz a lei https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2025/09/10/demissoes-no-itau-veja-o-que-diz-a-lei-sobre-monitoramento-no-home-office.ghtml
- O que as demissões no Itaú significam para o futuro do home office? https://veja.abril.com.br/economia/o-que-as-demissoes-no-itau-significam-para-o-futuro-do-home-office/
- Entenda como o cerco ao home office levou a demissões em massa no Itaú https://www.metropoles.com/negocios/demissao-em-massa-no-itau-resultou-de-pente-fino-no-home-office
- Caso Itaú: Demissão em massa reacende debate sobre futuro do home office https://www.infomoney.com.br/carreira/caso-itau-demissao-em-massa-reacende-debate-sobre-futuro-do-home-office/