O governo do presidente interino Michel Temer definiu nesta quinta-feira uma meta de déficit primário de 139 bilhões de reais para o governo central em 2017, abaixo do saldo negativo de 170,5 bilhões de reais previsto para 2016, numa vitória da ala econômica por uma cifra mais baixa para reforçar o compromisso fiscal.
O desafio, contudo, persiste para o time capitaneado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, já que para chegar ao número o governo se comprometeu com um esforço fiscal de 55,4 bilhões de reais, sem especificar como irá atingi-lo.
Meirelles afirmou em entrevista coletiva que aumentos pontuais de impostos não estão descartados. Segundo ele, entretanto, isso será definido até o final de agosto, quando da elaboração da proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) do próximo ano.
“Até lá, sim, (será definido) por que e se será necessário algum tributo e qual seria o tributo mais favorável do ponto de vista da eficiência e de atividade econômica”, disse Meirelles. Ele acrescentou que nesse período será avaliado quanto o governo poderá arrecadar com outorgas, concessões e vendas de ativos no próximo ano.
Na prática, o Executivo vai esperar o provável desfecho do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff antes de mexer na carga tributária.
Para chegar ao déficit, o governo também limitou o crescimento das despesas públicas em 2017 à variação da inflação deste ano, mesmo antes da aprovação pelo Congresso da proposta de emenda à Constituição que impõe esse limite.
Meirelles destacou que se o governo tivesse mantido o ritmo de crescimento de despesas mostrado anteriormente, o rombo do ano que vem rondaria os 270 bilhões de reais. Controlando os gastos, mas sem ação extra para geração de receita, o déficit seria de 194 bilhões de reais, o que significa que o governo fará um esforço fiscal de 55,4 bilhões de reais para entregar o que vai propor na Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Bastante questionado sobre o que vai compor esse esforço, nem Meirelles nem o ministro interino do Planejamento, Dyogo Oliveira, deram detalhes, se limitando a dizer que ele contará com uma série de receitas como concessões e venda de ativos.
O ministro da Fazenda reiterou em diversos momentos que o déficit delineado para o próximo ano representa compromisso forte e esforço muito grande de contenção de despesas e aumento de receita “de formas diversas”.
“Esse número não foi o primeiro número que se chegou. Não foi chegado facilmente”, disse.
Para o setor público consolidado, a previsão é de déficit de 143,1 bilhões de reais, equivalente a 2,1 por cento do Produto Interno Bruto, abarcando déficit de 3 bilhão de reais para estatais federais e um saldo negativo em 1,1 bilhões de reais para Estados e municípios.
Com isso, a expectativa é que a dívida bruta chegue a 76,6 por cento do PIB em 2017. A dívida líquida, por sua vez, deverá ir a 48,3 por cento do PIB. Nos dois casos, haverá um avanço significativo em relação aos dados mais recentes divulgados pelo Banco Central, que mostraram a dívida bruta em 68,6 por cento do PIB em maio, e a dívida líquida em 39,6 por cento do PIB.
Para fixar a meta de primário, o governo adotou uma estimativa de crescimento do PIB de 1,2 por cento no próximo ano, além de inflação de 4,8 por cento. Considerou ainda que haverá um déficit na Previdência de 183 bilhões de reais.
O rombo final estimado para as contas públicas não inclui previsão de capitalização de estatais, segundo os ministros, e nem tampouco uma possível extensão do programa de regularização de ativos no exterior, que termina este ano.
VITÓRIA DE MEIRELLES
A nova meta mostra que a equipe econômica ganhou a queda-de-braço com a ala política do governo de Temer, duro embate que atrasou em alguns dias o anúncio do número final.
Segundo uma fonte com interlocução direta com Temer, Meirelles deixou claro que o rombo não podia passar de 140 bilhões de reais “de jeito nenhum” para sinalizar compromisso com a arrumação das contas públicas.
A ala política, por outro lado, defendia a possibilidade de rombo maior a fim de não sufocar a já cambaleante economia em recessão e garantir um ambiente político mais favorável diante da necessidade de aprovar medidas no Congresso Nacional.
Para apresentar um número melhor, a equipe econômica estudava aumento de impostos em duas contribuições: a Cide e PIS/Cofins. No entanto, na manhã desta quinta-feira, convencido pelos ministros palacianos, o presidente interino telefonou para Meirelles para informá-lo de que não queria o anúncio de aumento de impostos, revelou à Reuters uma fonte palaciana.
A avaliação feita por auxiliares próximos é de que, antes do processo de impeachment ser aprovado no Senado e em um ano eleitoral, medidas impopulares como o aumento de impostos – mesmo sem necessidade de aprovação pelo Legislativo, como a Cide e o PIS/Cofins – criariam problemas com a base do governo no Congresso.
Um dos ministros mais próximos de Temer, Eliseu Padilha, da Casa Civil, defendia abertamente que não era possível anunciar aumento de impostos antes que o governo fizesse o “dever de casa”.
Apesar disso, a avaliação de Temer, contou outra fonte palaciana, era de que era necessário dar uma demonstração de força da equipe econômica, uma mostra ao mercado de que Meirelles tinha o comando das finanças do governo.
A difícil equação levou ao anúncio da meta que o ministro da Fazenda queria, mas sem o aumento de impostos necessários – que pode ficar
Crédito: Reuters Brasil – disponível na web 08/07/2016