Líderes ouvidos pela Reuters admitem que o governo vai ter que redimensionar o tamanho da base e renegociar a agenda a ser votada. “O governo não tem 308 votos para aprovar uma reforma da Previdência hoje. Tem 260, 270. É um longo caminho a percorrer”, disse o líder do DEM, Efraim Filho (BA).
Um caminho que irá depender cada vez mais do presidente da Câmara, com quem Temer vem tendo atritos constantes. Com o enfraquecimento político do presidente, Maia decidiu assumir o protagonismo da agenda econômica e chamou para si, por exemplo, a negociação para aprovação de uma reforma mínima da Previdência.
Maia deu seu primeiro passo nessa direção tão logo os deputados arquivaram a segunda denúncia contra Temer por organização criminosa e obstrução de Justiça. Em entrevista coletiva, o presidente da Câmara defendeu enxugar a reforma previdenciária em tramitação e tentar restringi-la no momento à adoção da idade mínima para a aposentadoria.
“O problema é que se misturou muitos temas (na reforma) e quando se mistura muitos temas acaba se tendo muitos adversários. Você soma adversários”, disse.
“Então se a gente pudesse concentrar a reforma da Previdência naquilo que é fundamental, eu acho que a idade mínima e acabar com essa transferência de renda do sistema previdenciário brasileiro de pobres para ricos”, defendeu.
Aliados do governo admitem que o desgaste da base de rejeitar em duas votações a autorização para que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue acusações criminais de um presidente com baixíssima popularidade praticamente inviabiliza a pretensão de o Palácio do Planalto se manter à frente das negociações da reforma da Previdência, outro tema bastante impopular.
Por isso, avaliam que o papel de Rodrigo Maia é fundamental nessa nova etapa do governo Temer. E o Planalto sabe disso. Nos últimos dias, todas as vezes em que falou da agenda do governo pós denúncia, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, citou a necessidade de negociar e combinar com Maia.
“A reforma é importante para o Brasil e não podemos pensar em entrar em 2019 sem reforma da Previdência”, disse o ministro, em evento no Tribunal de Contas da União (TCU). “Vamos ver com o Rodrigo Maia qual o calendário que ele propõe e também temos que ver com ele e com os líderes na Câmara quais são os tópicos que circunstancialmente devemos enfocar com mais veemência neste momento”, completou Padilha.
O presidente da Câmara, segundo aliados, pretende tentar votar algum texto da reforma ainda este ano, uma vez que no próximo as discussões eleitorais tomam corpo e a Previdência é considerada um assunto “tóxico” para os parlamentares candidatos.
A intenção bate com o discurso do governo, que também defende alguma votação até o final deste ano. Neste caso, como um acesso ao mercado, que ainda aposta em Temer para manter as reformas, mas já mostra descrença depois do resultado da votação da denúncia.
O protagonismo “delegado” a Maia pelo governo decorre da percepção de que, como durante a tramitação das duas denúncias, o deputado não atuou para derrubar Temer, o momento é de retribuição à atuação institucional dele.
Já nesta quinta-feira, mesmo tendo sido aconselhado por seus médicos a ficar em repouso, depois de ter sido internado com uma obstrução urinária na quarta-feira, Temer fez questão de ir ao Planalto assinar a liberação de 652 milhões de reais para obras de financiamento para o Rio de Janeiro, com Maia a seu lado.
No xadrez eleitoral de 2018, Maia tenta se arranjar buscando uma provável reeleição de deputado em outubro próximo – e que poderá também permitir a ele ser candidato à reeleição para chefe de uma das Casas Legislativo -ou até mesmo voos maiores, como candidato a vice-presidente da República.
Uma liderança partidária alinhada a Temer afirmou, sob a condição do anonimato, que Rodrigo Maia é um “grande parceiro” e tem de ter “voz ativa” nessa nova etapa do governo. Disse ainda que a base aliada, a partir de agora, só vai votar uma reforma da Previdência se for para “vencer”. “O deputado não vai se expor ao desgaste”, observou.
Contudo, o deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR), ex-ministro da Previdência no governo FHC, afirmou não haver muito espaço para enxugar o texto da reforma aprovado pela comissão especial da Câmara ainda em maio, antes da eclosão do escândalo que tragou a gestão Temer. Desde então, o texto está pronto para votação no plenário da Câmara, mas sem qualquer avanço.
“Há muito pouca margem de manobra, o principal está mantido”, disse Stephanes, ao destacar que, se for mexer muito, a reforma poderá perder o sentido.
BASE “SOFRIDA”
O principal empecilho para a reforma é a falta de apoio de deputados aliados, que já não era sequer assegurada mesmo antes dos escândalos envolvendo Temer. Uma mudança na regra da idade para se aposentar demandaria uma emenda constitucional e exigiria o apoio de 308 deputados em plenário.
Na votação da segunda denúncia, Temer teve 251 votos a favor e 233 contra. Ou seja, não houve o apoio público da metade dos 513 deputados. Na primeira acusação, em agosto, foram 263 apoiadores do governo e 227 contrários a ele.
Em entrevista, o presidente da Câmara reconheceu que hoje o governo tem uma base “muito sofrida” e que é preciso reorganizá-la. Mas ele sinalizou que essa tarefa caberá aos articuladores políticos do governo.
“Vamos ter que trazer uma agenda de segurança pública e então uma agenda econômica, nessa ordem. Tem que ter um folêgo e segurança é um tema que tem mais convergência. Precisamos fazer essa travessia para que o governo retome o fôlego”, disse o líder do DEM.
Parte da base defende exatamente que a Câmara se dedique nas próximas semanas a votar temas mais afáveis para a população do que a reforma da Previdência. O desgaste de defender um governo com apenas 3 por cento de aprovação, somado à votação de um reforma impopular parece, aos olhos de alguns parlamentares como um caminho para derrota em 2018.
Integrantes de partidos da base pressionam, desde a análise da primeira denúncia, para que haja uma reforma ministerial a fim de contemplar no primeiro escalão os partidos mais fiéis a Temer e desalojar os traidores. O recado tem como alvo o PSDB e o PSB, partidos que votaram rachados nas duas ocasiões.
O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), afirmou que uma eventual reforma ministerial com esse perfil de mudança poderia ajudar o governo a se reorganizar. Segundo ele, o PP não faz qualquer tipo de exigência por considerar que está “bem contemplado” pelo Executivo.
“Não vou negar que um partido que tem representação e tem uma postura de infidelidade, de falta de compromisso, cria um constrangimento e é muito ruim para a base aliada”, disse.
Outro líder com bom trânsito no Planalto, no entanto, afirma que a questão de espaços e fidelidades serão resolvidas com cargos de escalões inferiores, e uma reforma ministerial está afastada por ora.
“Em abril quem vai ser candidato precisa se desincompatibilizar. Quem sentar não vai ter nem tempo de achar as gavetas”, disse.
Alvo de uma das pastas cobiçadas por aliados, o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, disse no dia da votação não ter participado de nenhuma conversa nos últimos dias de uma eventual reforma ministerial. “Não comentaram nada”, afirmou em entrevista, após ter reassumido o cargo de deputado para votar a favor
Crédito: Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu com reportagem adicional de Maria Carolina Marcello da Reuters Brasil – disponível na internet 27/10/207