Três servidores são presos por semana. PF do Paraná é a que mais prende servidores públicos

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Três funcionários públicos são presos a cada semana no País, em média, sob acusação de envolvimento com organizações criminosas responsáveis por desvios de verbas públicas, crimes fazendários, delitos ambientais e até mesmo tráfico internacional de drogas. Os números fazem parte de levantamento inédito obtido pelo Estado na Divisão de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor), da Polícia Federal, e englobam resultados de 2.325 operações feitas entre janeiro de 2013 e março de 2017.

A análise dos dados, obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, mostra ainda que o total de agentes públicos detidos pelos federais cresceu 57% nos 24 meses após a deflagração da Operação Lava Jato, em 2014, na comparação com os dois anos anteriores (469 contra 298).

Para o ex-secretário nacional antidrogas e juiz aposentado Walter Maierovitch, o número de detidos poderia ser maior ainda. De acordo com ele, há pouca investigação sobre o envolvimento de servidores com as organizações criminosas, apesar de “a criminalidade organizada não existir sem a conivência de agentes públicos”.

Contas

Os números da Dicor mostram que são as operações que investigam corrupção, fraudes em licitações e desvios de verbas públicas que mais surpreenderam agentes públicos envolvidos com as chamadas organizações criminosas. Ao todo, 45% dos 783 detidos foram apanhados nessas circunstâncias. Em segundo lugar nesse ranking estão os casos de crimes fazendários, como a sonegação fiscal e o contrabando (16% do total), e depois os delitos cometidos contra a Previdência Social (10%). Essas organizações criminosas são chamadas pelos estudiosos de “parasitárias”, ou seja, vivem dentro do Estado.

Para Márcio de Souza Christino, procurador de Justiça de São Paulo, é mais fácil um agente público se envolver com organizações criminosas que desviam verbas públicas, como as investigadas pela Lava Jato. “É mais fácil, menos perigoso e menos exposto do que a prática de crimes violentos”, afirmou. Para ele, os números mostram o resultado do aumento da repressão a esse tipo de delito, além da maior experiência da PF e de mais investimentos da instituição.

Segundo a delegada Tânia Prado, da Associação Nacional dos Delegados Federais, o aumento de prisões está ligado à estruturação do combate ao desvio de verbas públicas. O fenômeno começou em janeiro de 2002, quando a PF passou a usar interceptações telefônicas para investigar desvios de recursos – antes o método era reservado às investigações sobre tráfico de drogas.

Depois, em 2012, a PF criou o Serviço de Repressão a Desvios de Recursos Públicos (SRDP). Até então cada setor investigava casos de corrupção em sua área. O desvio de verbas passou a concentrar os inquéritos e a contar com banco de dados próprio. “Geralmente esses casos estão ligados a licitações, como editais dirigidos”, afirmou Tânia Prado. De acordo com ela, o combate à corrupção virou a prioridade da instituição. Em 2015, o SRDP se tornou uma delegacia e, neste ano, a direção da PF criou a Coordenação Geral de Combate à Corrupção, chefiada pelo delegado Josélio Azevedo, estruturando de vez essa atividade no órgão.

Além das chamadas organizações parasitárias, os números da Dicor envolvem grupos criminosas de tipo violento, como o Primeiro Comando da Capital (PCC), que atuam no tráfico de drogas e em crimes patrimoniais, como roubos e sequestros. Os funcionários públicos envolvidos com esse tipo de organização representam apenas 4,5% do total. “Quem (o funcionário público) se envolve com essas organizações violentas não é participante, integrante da organização”, disse Christino. “Normalmente ele é corrompido e se torna conivente com tráfico de drogas ou crimes violentos, como o roubo de cargas.”

Diferenças

Os Estados de Santa Catarina, Amazonas e Alagoas foram os que registraram a maior quantidade de servidores apanhados em organizações violentas. Para Maierovitch, ainda não há no Brasil um elo entre as organizações violentas e o desvio de verbas públicas, como acontece na Itália, por exemplo, nem há um relacionamento claro entre criminosos e poder público, como no México. “As organizações criminosas violentas parasitárias atuam, principalmente, no nível municipal”, disse. Esse tipo de situação exigiria uma extensa contaminação do aparelho policial.

Para o coronel Nivaldo Restivo, comandante-geral da maior Polícia Militar do Brasil – a de São Paulo, com seus 87 mil homens -, isso está longe de acontecer. “Temos problemas muito pequenos no Estado, alguns policiais envolvidos com quadrilhas especializadas no roubo de caixas eletrônicos.” A maioria das denúncias investigadas pela Corregedoria da PM, segundo ele, ainda envolvem casos de uso excessivo da força.

PF do Paraná é a que mais prende servidores públicos
Quando se leva em conta a taxa de presos em relação ao total da população, Estados da Região Norte aparecem no topo do ranking

A disseminação dos métodos de investigação da Operação Lava Jato colocou o Paraná na liderança do ranking nacional de prisões de agentes públicos envolvidos com organizações criminosas. Dos 86 funcionários públicos detidos no Estado desde 2013, dois terços foram acusados de envolvimento com desvios de verbas públicas, fraudes em licitação ou corrupção – proporção acima da média nacional (45%).

Segundo dados obtidos pelo Estado por meio da Lei de Acesso à Informação, 783 funcionários públicos foram presos em operações da Polícia Federal, em todo o País, entre 2013 e março de 2017. Na média, foram três detenções de servidores por semana nesse período.

Disseminação de métodos da Lava Jato deu primazia ao Paraná nas prisões
Disseminação de métodos da Lava Jato deu primazia ao Paraná nas prisões  Foto: RODRIGO FÉLIX LEAL/FUTURA PRESS-3/8/2016

“As organizações que desviam verbas públicas têm natureza parasitária, ou seja, precisam da ação de funcionários públicos para desviar verbas e fraudar licitações”, afirma o procurador de Justiça de São Paulo Márcio Sérgio Christino, especializado no combate a organizações criminosas.

MÉTODOS DA LAVA JATO SÃO REPLICADOS

Os métodos de investigação da Lava Jato foram replicados em outras operações da PF feitas pela Superintendência do Paraná – cruzamento e análise de documentos do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria Geral da União (CGU), além do uso de conduções coercitivas e de delações premiadas para desarticular quadrilhas.

Assim foi na Operação Carne Fraca, que investigou a suposta conivência de fiscais do Ministério da Agricultura com fraudes em frigoríficos na região – 34 dos 86 agentes públicos supostamente envolvidos com organizações criminosas no Paraná foram detidos durante essa operação. Ao todo, a PF cumpriu 77 mandados de condução coercitiva somente na Carne Fraca – liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu no final de dezembro o uso desse instrumento.

A segunda operação com maior número de agentes públicos presos no Paraná nos últimos cinco anos foi a Fractal, feita pela PF em 2013. Ao todo, 16 policiais civis, militares e federais foram detidos sob a suspeita de facilitar a entrada de contrabando no País. A organização criminosa contaria ainda com ramificações na Assembleia Legislativa do Paraná e na Receita Federal.

PARANÁ LIDERA PRISÕES

O Paraná lidera em números absolutos de prisões (86), seguido por Mato Grosso (70), Minas Gerais (55), Rio de Janeiro (54) e Pará (53). Mas isso não quer dizer, necessariamente, que os maiores focos de criminalidade no serviço público estejam nesses Estados. A PF pode ser mais ativa nesses lugares, ou pode ser maior o número total de servidores públicos federais, estaduais e municipais.

Como não há dados precisos sobre a quantidade de funcionários públicos em cada unidade da Federação, o Estado calculou a taxa de servidores presos por milhão de habitantes. Com esse critério, o ranking muda, e Roraima, Acre e Rondônia passam às primeiras posições. Os três Estados não são os únicos da Região Norte a aparecer em destaque: as taxas de Amapá, Amazonas e Tocantins também estão entre as dez maiores do País.

O mapa publicado nesta página mostra que há um eixo, do norte ao centro-oeste do Brasil, no qual as taxas de servidores presos são maiores. Os dados obtidos pelo Estado com a Divisão de Investigação e Combate ao Crime Organizado (Dicor), da Polícia Federal, reúnem informações sobre 2.325 operações policiais realizadas entre janeiro de 2013 e março de 2017 em todo o País.

A Região Norte lidera tanto o ranking em números absolutos (185 funcionários públicos presos) quanto a taxa de servidores presos por milhão de habitantes (10,6). A segunda maior taxa foi registrada pelo Centro-Oeste (9,4) e a menor foi a da região Sudeste (1,9).

Crédito: Marcelo Godoy e Daniel Bramatti/O Estado de S.Paulo – disponível na internet 03/01/2018

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