No entender das entidades médicas e de defesa dos direitos do consumidor, a ideia da ANS, no caso da coparticipação, é estabelecer um teto de até 40%. “Se a conta é de R$ 1 mil, o consumidor ajudaria a pagar a conta, pagando R$ 400 pelo procedimento. Isso sem contar a mensalidade”, disse a representante do Proteste, Marinês Dolci.
Quanto à franquia, Marinês explicou que seria algo semelhante a um seguro de carro, com o estabelecimento de um limite de gastos. “Haveria um teto de gastos, e o consumidor teria que pagar o valor extra. Nesse caso, um consumidor que paga R$ 500, teria o valor extra de R$ 6 mil [12 vezes o valor da mensalidade]. Se a conta do hospital for superior a isso, ele [consumidor] paga o restante.”
Os representantes das entidades que participaram do debate apontaram problemas nos dois sistemas. Florisval Meinão, da APM, lembrou que as consequências desses sistemas não têm sido muito debatidas com os pacientes. Para Meinão, os grandes prejudicados com a adoção deles seriam os portadores de doenças crônicas, que usam os serviços com certa frequência, e os aposentados, que, devido à “restrição orçamentária”, teriam dificuldade para “’arcar com custos imprevisíveis”.
As entidades ligadas aos médicos e à defesa do consumidor temem ainda que as cobranças levem muitas pessoas a desistir dos planos de saúde e a procurar cada vez mais o Sistema Único de Saúde (SUS), o que poderia provocar colapso na rede pública. Além disso, destacam que o alto custo dos procedimentos e os valores que o consumidor teria de pagar contribuiriam para aumentar o número de processos na Justiça.
“É diferente da franquia de um automóvel, quando ele quebra ou tem um acidente. Se a pessoa não pode pagar a franquia, deixa o carro parado, não o utiliza”, afirmou Meinão. Com a saúde, a situação é outra: “a pessoa é obrigada a se submeter aos procedimentos necessários para o diagnóstico e o tratamento. Portanto, vai ter que se endividar ou vender seus bens para garantir o tratamento”, disse o diretor da APM. Para ele, isso é um absurdo, porque a pessoa já paga o plano de saúde, que deveria garantir o tratamento integral.
A pesquisadora em saúde Ana Carolina Navarrette, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), aponta três formas de impacto com essas mudanças: “O primeiro é se endividar. Diferente de um carro, ele não tem a escolha de poder deixar o carro de lado e andar de ônibus. Não pode escolher se vai fazer agora ou não uma operação no apêndice. O segundo caminho é não fazer o procedimento e aí postergar isso para um momento que pode ser pior. E o terceiro caminho é pagar plano de saúde e ir para o SUS, o que não é um problema, já que ele [SUS} vai receber as pessoas. O problema é que não existe um estudo de impacto sobre isso no SUS”, disse Ana Carolina à Agência Brasil.
Outro lado
Em nota, a Agência Nacional de Saúde Suplementar destaca que tais mecanismos de regulação já existem e têm previsão na Lei 9.656/98 e na resolução do Conselho de Saúde Suplementar (Consu nº 8, de 1998), que, além de ter sido editada antes da criação da ANS, contém regras genéricas e abertas, com lacunas que causam insegurança jurídica e imprevisibilidade aos consumidores.
Segundo a AMS, o uso da coparticipação e franquia é facultativo: o consumidor só contratará um plano de saúde com essas características se entender que é mais vantajoso. A agência diz que tais opções são amplamente utilizadas, ressaltando que, em 2007, cerca de 22% dos beneficiários de planos de saúde tinham planos com coparticipação e franquia e, hoje, já são mais de 50%. De acordo com a ANS, a proposta em debate estabelece parâmetros para aplicação da coparticipação e franquia, como limites de exposição financeira mensal e anual que protegerão o consumidor. A agência diz ainda que, se aprovada, a proposta será aplicada somente aos contratos firmados após a vigência da nova norma, sem afetar os contratos existentes.
Para a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), a proposta da ANS “modernizará uma norma que já existe há 20 anos”. Planos de saúde com mecanismos financeiros de regulação, como copartipação e franquias, ressalta a Abramge, já estão disponíveis no mercado. “Atualment, 50% dos beneficiários estão vinculados a planos com esstes mecanismos”, nota da associação. A Abramge destaca ainda que a modernização é importante para abrir “oportunidade para que novos planos de saúde sejam ofertados no mercado” e que os atuais “vão continuar disponíveis”.
Agência Brasil de Notícias 26/04/2018