Inadimplência de tarifas de água, luz e telefone já supera a bancária

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Segundo Serasa, 40% dos adultos têm contas atrasadas há pelo menos 90 dias

Nando Coimbra, sócio de um salão de beleza em São Paulo, realizou, em 2014, o sonho de muitos brasileiros: quitou as prestações de seu apartamento. Para pagar impostos e lavrar a escritura, pegou um novo empréstimo bancário. Foi quando a crise se acentuou. O faturamento do salão caiu 60% em poucos meses. Foi assim que ele entrou para uma estatística que, não à toa, foi parar na campanha eleitoral: a dos brasileiros que devem, mas não pagam.

De acordo com levantamento da Serasa, 40% dos adultos no país — 61,5 milhões de pessoas — têm contas atrasadas há pelo menos 90 dias. Com uma crise que já dura cinco anos, é cada vez mais difícil sair do vermelho, e a inadimplência muda de perfil. Com mais dificuldade para obter empréstimos nos bancos, a maioria fica com o nome sujo por causa de gastos do dia a dia.

Os atrasos de contas de água, luz, gás e telefone já superam os relacionados a bancos e cartões de crédito. Em agosto de 2017, as dívidas bancárias somavam 30,1% do total em atraso e as contas de serviços, 28,7%. Este ano, porém, as dívidas com tarifas alcançaram 31,2% e os atrasos relacionados a bancos, 28,5% do total.

Escolher o que pagar

Nando foi nesse caminho. Usou reservas para se manter em 2015 enquanto esperava a recuperação econômica que não veio. As clientes continuaram rareando, e começou a faltar para o básico. Além da dívida bancária, acumulou 18 meses de condomínio atrasado.

— Meu faturamento cobria apenas despesas básicas, como alimentação. Quando a luz estava para ser cortada, eu pagava e deixava outra conta atrasar — conta o cabeleireiro, que resolveu passar uma temporada trabalhando nos EUA para voltar e quitar as dívidas.

— Muitas famílias estão escolhendo o que pagar — diz Luiz Rabi, economista-chefe da Serasa, para quem a dificuldade de milhares de pessoas para saldar dívidas está ligada à deterioração do mercado de trabalho. — Há três anos o desemprego não sai de dois dígitos. Isso faz tudo mais difícil.

A taxa de desemprego, que era de 8,5% em 2015, já chegou a 12%. E para quem tem trabalho, a renda não acompanha os reajustes das tarifas. De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a conta de luz subiu 20,13% no Rio e 19,58% em São Paulo desde 2016. A maioria das categorias teve reajuste salarial zero este ano, diz o Dieese. Para muitos trabalhadores autônomos, como Nando, a renda até caiu.

A inadimplência atinge todas as faixas de renda, mas é maior entre os mais pobres. Seis em cada dez que ganham entre um e dois salários mínimos têm dívidas atrasadas.

A diarista Marizete Dias deve R$ 1.032 à concessionária de energia Eletropaulo desde março. A dívida é pouco menor que os R$ 1.450 que ela ganhava naquela época trabalhando três vezes por semana. Agora, só consegue fazer uma diária por semana.

— Estou praticamente desempregada, e o preço da luz não para de subir. Não tenho como pagar — diz Marizete, que renegociou o débito, mas voltou a ficar inadimplente.

Segundo Dilson Moura, da plataforma de negociação Acordo Certo, só 40% dos que fazem acordo com credores honram o compromisso.

Crédito:Cleide Carvalho/O Globo – disponível na internet 24/09/2018

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