Da concorrência ao consumidor, os impactos da ofensiva da gigante Amazon no mercado brasileiro

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A gigante do varejo Amazon, uma das maiores do mundo, começou a dar passos mais firmes para conquistar parte do mercado brasileiro. Com a inauguração de um centro de distribuição próprio e o lançamento de serviço de assinatura, a empresa de Jeff Bezos, o homem mais rico do mundo, entra de vez no país.

Mas por que levou tanto tempo? E qual será o impacto desse movimento?

Nunca houve dúvida sobre o interesse da Amazon em crescer no e-commerce do Brasil. Mas a estratégia adotada para o país sempre foi questionada – de lenta e fora do timing, para alguns, a excessivamente cautelosa, para outros.

Boa parte da desconfiança em relação à gigante americana começa a cair por terra neste ano com dois movimentos estratégicos relevantes.

Em janeiro, a varejista inaugurou o Centro de Distribuição (CD) em Cajamar (SP) incrementando a oferta de produtos. Agora, traz ao Brasil o seu serviço de assinatura – o Amazon Prime.

O Prime funciona como um grande pacote que oferece aos assinantes promoções exclusivas, frete grátis e uma série de conteúdos de mídia distribuídos via streaming.

A Amazon demorou para iniciar sua atuação no país e o fez de maneira tímida. Em 2012, começou a vender no Brasil apenas livros e o Kindle, seu leitor digital. Cinco anos depois, em 2017, abriu sua plataforma de vendas para pequenas empresas, quando a maior parte dos concorrentes já estava bem posicionada neste segmento.

Só em janeiro deste ano, ao inaugurar o CD na Grande São Paulo, com 40 mil m² de área, pode expandir para a venda direta e ampliar a gama de produtos oferecidos, agora com itens que vão de fraldas a ferramentas, incluindo itens de limpeza, beleza e eletroeletrônicos.

“A entrada da Amazon no país pode parecer lenta, mas não é. Ela tem uma estratégia de longo prazo para o Brasil, país que é muito complexo de atuar”, comenta Alberto Serrentino, consultor da Varese Retail Strategy, acrescentando que “só após achar o modelo vencedor é que a varejista fica agressiva”.

O analista de digital consumer da Euromonitor Ricardo Sfeir faz coro e reforça a visão de longo prazo da varejista nos mercados em que atua.

“Ela não ficou parada, ao contrário, estava ser organizando em um país difícil de navegar, com questões tributárias e logísticas relevantes. Com o caminho pavimentado, dá seus passos mais importantes agora com o CD e o Prime”, explica Sfeir.

Depósito da Amazon no Brasil
No Brasil, 36% da população compra ou já comprou pela internet e se torna mercado atraente para a Amazon e outros e-commerces. Direito de imagem JULIO VILELA/AMAZON/DIVULGAÇÃO

Crescimento do varejo online

O interesse da Amazon em fincar os dois pés no mercado brasileiro se justifica pela força que o setor vem demonstrando no país.

A pesquisa Webshopper, realizada pela Ebit | Nielsen, revela que, em 2018, o faturamento com vendas online – entre produtos novos, usados, ingressos e passagens aéreas – chegou a R$ 133 bilhões, 18% maior do que em 2017, ano em que já tinha avançado 20% sobre 2016.

No Brasil, 36% da população compram ou já compraram pela internet. Se forem considerados apenas produtos novos e o marketplace, o faturamento foi de R$ 53,2 bilhões em 2017, alta de 12% sobre ano anterior.

O dado mais recente da Ebit | Nielsen aponta novo avanço no mesmo percentual, 12%, no primeiro semestre de 2019 sobre janeiro a junho de 2018. O valor médio das compras feitas online no ano deve ficar em R$ 415.

A expectativa dos consultores é que, a partir de agora, a Amazon conquiste uma fatia maior deste mercado bilionário e passe a incomodar de forma mais efetiva a concorrência.

Isso deve ocorrer principalmente no Sudeste e no entorno por conta das facilidades que o CD de Cajamar proporciona em termos logísticos.

“Quando a varejista chegou aqui, pelo seu tamanho global, já causou efeito na concorrência que precisou se mexer e agora, com o Prime, não será diferente. Todos devem investir para melhorar a entrega, o serviço oferecido e também para chegar a mais cidades”, analisa Sfeir, da Euromonitor.

O formato de lançamento do serviço de assinatura no Brasil é essencial nas análises dos consultores.

Funcionário da Amazon na Alemanha
Expectativa dos consultores é que, a partir de agora, a Amazon conquiste uma fatia maior deste mercado bilionário no Brasil. Direito de imagem GETTY IMAGES

O Amazon Prime chega para clientes no Brasil com a maior oferta de benefícios já disponibilizada nos lançamentos do programa em 14 anos de história, em que chegou a 100 milhões de membros em 18 países. Por R$ 9,90 por mês, ou R$ 89 no pacote anual, o Amazon Prime oferece além de frete grátis e rapidez, uma série de conteúdos por streaming.

Os assinantes terão acesso a filmes, série originais, uma seleção gratuita de loots (itens virtuais extras dentro de games) e jogos no Twitch Prime. A assinatura também dá acesso a músicas, sem anúncios, no Prime Music e a um catálogo rotativo de revistas e livros digitais.

“O Prime não é só varejo, mas uma estratégia para o digital muito inteligente. A Amazon streaming ataca segmentos que crescem muito, como o de games com taxas de dois dígitos ao ano”, comenta o analista da Euromonitor.

Concorrência

A comparação entre o que oferece o serviço lançado pela Amazon e seus concorrentes, não apenas no e-commerce, é inevitável. O principal diferencial é que com uma única assinatura vários conteúdos ficam disponíveis.

O cliente Prime terá acesso a 2 milhões de músicas sem propaganda concorrendo, de certa forma, com o serviço gratuito do Spotify, com mais títulos mas que obriga o usuário a conviver com comerciais.

Considerando quando o serviço é pago à parte, a briga já vinha ocorrendo entre Amazon Music Unlimited, Spotify e Apple Music, com acervos mais completos. Em filmes e séries, o Prime bate de frente com a Netflix. No varejo online, seus principais concorrentes têm produtos semelhantes.

A B2W possui o Submarino Prime, com entrega rápida e gratuita por R$ 79,90 ao ano; a Magazine Luiza só entrega de graça para compras feitas pelo aplicativo e a partir de determinado valor.

Já o Mercado Livre tem o Mercado Pontos, em que para ter direito ao benefício de um desconto no frete – ou mesmo gratuidade – o cliente precisa acumular pontos.

“Alguns destes serviços, quando o frete é gratuito, atendem a menos CEPs do que a proposta da Amazon, em outros casos anunciam a entrega em um prazo maior do que a varejista americana. O serviço da Amazon é mais abrangente. Três dias para locais como Salvador e Recife está ótimo”, comenta Sfeir.

“O Prime é o pulo do gato da Amazon aqui e no mundo foi assim. Só trouxeram agora porque precisavam de massa crítica, de um volume de clientes que já compram na plataforma”, explica Serrentino, acrescentando que “o cliente do Prime tendem a se tornar recorrente concentrando as compras na plataforma, o que inclusive permite à empresa trabalhar com margens mais interessantes, fugindo um pouco da guerra de preços”.

No ano passado, a Amazon foi a oitava maior varejista online do país, segundo dados da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), com um faturamento de R$ 600 milhões, 46% superior aos R$ 410 milhões de 2017, ano em que já havia dobrado a receita. Mesmo com o forte crescimento, a Amazon está distante dos líderes.

Centro de distribuição da Amazon em São Paulo
Principais concorrentes da Amazon viram suas ações despencarem no dia do anúncio do Prime no país. Direito de imagem JULIO VILELA/AMAZON/DIVULGAÇÃO

A B2W – dona da Submarino, Americanas.com e outras – faturou R$ 8 bilhões, seguida pela Via Varejo – Ponto Frio e Casas Bahia – com R$ 6,9 bilhões. Na terceira posição, Magazine Luiza com R$ 6,7 bilhões.

Com capital aberto na bolsa, os principais concorrentes viram suas ações despencarem no dia do anúncio do Prime no país: B2W caiu 4,8%, Via Varejo recuou 3,7% e Magazine Luiza registrou perda de 5,5%. No dia seguinte, o anúncio do IBGE de que as vendas no varejo subiram 1% em julho surpreendeu e as varejistas recuperaram em parte as perdas.

Os consultores falam em uníssono que, daqui em diante, a Amazon será mais agressiva no Brasil, o que provocará reações preventivas dos concorrentes. No entanto, este incômodo terá um limite, já que para ganhar capilaridade e chegar às primeiras colocações a varejista precisa investir em logística.

“Acredito que os próximos passos sejam ampliar o CD de Cajamar e também instalar mais centros de distribuição em outras regiões, quando ficaria em pé de igualdade para concorrer com os líderes do e-commerce”, comenta Alberto Serrentino.

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