Fiocruz: Brasil está mais preparado contra Covid-19 que contra H1N1

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O Brasil está mais preparado para lidar com o Covid-19 do que estava em 2009 para enfrentar a pandemia da gripe H1N1. A afirmação é do médico infectologista Rivaldo Venâncio, coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição científica vinculada ao Ministério da Saúde. O médico diz que a população precisa se manter informada, mas ressalta que não há razão para pânico.
 

Segundo Rivaldo, os casos ocorridos até agora em diversos países são em sua maioria leves ou moderados. “Há inclusive casos assintomáticos, em que a pessoa, embora tenha sido infectada, não desenvolve nenhuma manifestação clínica. A ampla maioria dos casos são leves e moderados – talvez uns 80%, 85%, até 90%. E é pequena a parcela de infecções com manifestações clínicas mais fortes.”

O Covid-19, como é chamada a doença causada pelo novo coronavírus, começou a se disseminar na China no final de dezembro e em mais 49 países já foram registrados casos. Em alguns deles, como a Itália e a Coreia do Sul, o surto avançou rapidamente nos últimos dias. Até o último dia 28, a China havia registrado 78.959 casos, com taxa de mortalidade de aproximadamente 3,5%. No resto do mundo, eram 4.351 ocorrências, das quais em cerca de 1,5%, os pacientes morreram. Naquele dia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) elevou para “muito alto” o risco em nível globa. No Brasil, havia 182 casos considerados suspeitos e um caso confirmado em São Paulo: um homem de 61 anos que esteve na Itália.

Os primeiros sintomas da doença podem levar até 14 dias para aparecer. “O mais comum é que, em torno de uma semana a partir da infecção, a pessoa desenvolva a enfermidade. E, uma vez desenvolvendo as manifestações clínicas, há um período médio de uma semana a 10 dias de transmissão. Há, no entanto, algumas observações sendo feitas por autoridades sanitárias da China de que, aparentemente, algumas pessoas estariam provocando a transmissão do vírus um pouco antes de se manifestarem os primeiros sintomas”, destaca o médico.

Com sede no Rio de Janeiro, a Fiocruz é uma das instituições habilitadas a fazer os testes laboratoriais capazes de detectar a presença do vírus. Os exames são realizados a partir de amostras de material clínico coletado das narinas ou da faringe dos pacientes. Os resultados saem após um período que varia entre 24 e 72 horas.

O Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, e o Instituto Evandro Chagas, em Belém, também estão preparados para as análises. Ambos são vinculados ao Ministério de Saúde. A tendência é que essa rede de diagnóstico aumente. Em Goiânia, testes já são realizados pelo Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen), administrado pelo governo estadual. O Lacen foi capacitado levando em conta a chegada ao estado de brasileiros que foram resgatados em Wuhan, na China. Os repatriados ficaram em quarentena na Base Aérea de Anápolis, em Goiás.

Segundo Rivaldo, o Brasil evoluiu nos últimos 20 anos no enfrentamento de emergências de saúde pública a partir de experiências concretas. Ele cita o surto global de coronavírus, que ficou conhecido como síndrome respiratória aguda grave (Sars) em 2002, a ameaça do ebola em 2014, que acabou não alcançando o Brasil, e a pandemia da gripe H1N1 que se expandiu para o mundo a partir do México. A esses episódios, soma-se o combate a enfermidades como a dengue, a zika e a chikungunya, além das emergências sanitárias decorrentes de outras causas como os rompimentos de barragens de mineração nos municípios mineiros de Mariana, no ano de 2015, e Brumadinho, no ano passado.

“O SUS, nosso Sistema Único de Saúde, aprendeu muito com tudo isso, e a rede de saúde complementar também cresceu nesse período. Isso fez com que pudéssemos antever algumas dificuldades e preparar estruturas para enfrentar o novo surto mundial de coronavírus com uma rapidez infinitamente maior do que em 2009, diante da pandemia de H1N1. Eu diria que, neste momento, o Brasil está mais preparado para fazer a detecção da doença. Evidentemente, isso vai depender da magnitude da transmissão. Lembrando que em algumas localidade do país, sobretudo em regiões metropolitanas, existem dificuldades na rede assistencial, que são de conhecimento público”, avalia o infectologista.

Rivaldo destaca um lado positivo, que é o aprendizado das últimas décadas, mas lembra um aspecto negativo, que foi a desestruturação, em algumas localidades, da rede que estava estabelecida. “Tivemos uma redução da cobertura da assistência pela Estratégia de Saúde da Família, que é o primeiro nível de atenção no SUS. Então, é preciso planejamento, considerando que o coronavírus pode ser uma demanda adicional ao que já enfrentávamos”, acrescenta o médico, ressaltando que deve ser mantida a atenção às demais enfermidades.

Vulnerabilidade

Os grupos que desenvolvem manifestações mais intensas são aqueles tradicionalmente considerados mais vulneráveis a outras doenças respiratórias, como gripe ou sarampo: pessoas com mais de 60 anos, sobretudo as que já têm algum comprometimento de saúde como uma doença pulmonar crônica, hipertensão e diabetes. Também precisam de mais atenção pessoas que usem medicação imunossupressora ou que tenham imunossupressão adquirida causada, por exemplo, pelo vírus HIV.

Até sexta-feira (28), o único caso confirmado no Brasil era o de um empresário de 61 anos, que se recupera em casa. Segundo Rivaldo, eventuais internações têm de ser analisadas caso a caso, e a avaliação da vulnerabilidade precisa levar em conta outros fatores além da idade. “Temos pessoas de 60 anos que nunca fumaram, que não têm hipertensão, nem diabetes e que praticam atividade física. A vulnerabilidade dessa pessoa pode ser menor que a de outra com 40 anos que fuma desde os 15 e leva uma vida sedentária.”

O infectologista destaca alguns protocolos domésticos: “não compartilhar objetos como copos e talheres e, de preferência, ficar em um quarto separado, que seja ventilado, bem arejado e com a janela aberta. Evitar ficar em sala fechada, assistindo à televisão com quatro, cinco ou seis pessoas. Se morar um idoso em casa, de 80 anos ou mais, o paciente deve tomar cuidado com o contato e evitar o mesmo ambiente. E, claro, tomar os cuidados de higiene pessoal.”

Autoridades públicas de saúde recomendam que se lavem as mãos e o rosto com frequência e cobrir o nariz e a boca, preferencialmente com um lenço descartável, se for tossir ou espirrar. Se não tiver o lenço descartável, a pessoa deve usar a dobra do cotovelo. Se tossir ou espirrar nas mãos, deve lavá-las em seguida. Em caso de suspeita de infecção, cabe à pessoa evitar locais de aglomeração. A confirmação do caso em São Paulo demanda uma elevação do nível de atenção. Para Rivaldo, aumentou a chance de que o vírus esteja circulando no Brasil em breve.

“Temos um caso confirmado, adquirido no exterior, mas que pode ter iniciado uma cadeia interna dentro do país. É preciso aguardar os próximos dias para saber se houve uma consequência maior desse primeiro caso. A circulação interna se torna uma possibilidade mais forte. A quantidade de países que passou a registrar a transmissão sustentável do vírus aumentou bastante. Então as chances de pessoas infectadas ainda em período de incubação entrarem no Brasil se tornam maiores. E não é só a China, que é um país para o qual o Brasil não tem voos diretos. Mas a Itália, por exemplo, já tem transmissão interna, e nós temos voos diretos de lá. Então a probabilidade de introdução do coronavírus no Brasil aumentou razoavelmente”, afirma o médico.

Tratamento

Os primeiros sintomas são febre e manifestações respiratórias que podem ser tosse seca, espirro, coriza principalmente. Nos casos mais intensos, o paciente sente dificuldades na respiração, que podem progredir, por exemplo, para uma pneumonia. O desenvolvimento de novos medicamentos e vacinas está em estudo, mas, por enquanto, o tratamento tem se dado sobre os sintomas. Ministra-se medicação para febre ou para dores de cabeça, quando é o caso. Nos casos mais intensos, recorre-se à oxigenioterapia, em que é colocada um suporte de oxigênio para melhorar a respiração do paciente.

De acordo com Rivaldo, a elaboração da vacina demanda uma mobilização internacional. A Fiocruz e seus parceiros estrangeiros já compõem as redes de pesquisas, mas ainda é cedo para estimar quando o imunizante poder ficar pronto. De outro lado, o Ministério da Saúde antecipou a vacinação da gripe comum, que será distribuída preferencialmente para alguns grupos como gestantes, crianças de até 6 anos de idade e idosos. Segundo o infectologista, a medida pode ajudar na redução de casos mais graves de coronavírus.

“É importante deixar claro que a vacina da gripe não protege contra o corona. De outro lado, ela reduz a quantidade de pessoas com quadro de infecção respiratória. O fato de os pulmões não terem sofrido dois ou três meses antes uma infecção pela gripe pode ajudar a evitar casos mais graves no caso de uma infecção posterior pelo coronavírus”, ressalta o médico.

A entrevista foi concedida no dia 28 de fevereiro

Agência Brasil de Notícias 02/03/2020


Novo coronavírus: Fiocruz recebe visita técnica

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) recebeu, na manhã desta quinta-feira (30/1), a visita do secretário executivo do Ministério da Saúde (MS), João Gabbardo, e do secretário de Vigilância em Saúde do MS, Wanderson Kléber de Oliveira, que acompanharam de perto as ações desenvolvidas pelo Laboratório de Vírus Respiratórios e Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Referência em nível nacional para o diagnóstico de vírus respiratórios, o Laboratório está diretamente envolvido na resposta brasileira ao novo coronavírus (2019-nCoV). 

Integrante há mais de 60 anos da rede global de vigilância em Influenza junto à Organização Mundial da Saúde (OMS), o Laboratório tem desempenhado papel estratégico em episódios de emergência em saúde pública, incluindo a atuação na linha de frente no diagnóstico laboratorial durante os surtos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars), em 2002 e 2003, e de Influenza A (H1N1), em 2009, além de ter integrado o esforço de esclarecimento de casos suspeitos de ebola, em 2015.

A visita contou também com a presença do chefe de Gabinete da Presidência da Fiocruz, Valcler Rangel; da vice-diretora de Referência e Coleções Biológicas da Fiocruz, Elizabeth Ferreira Rangel; do coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fiocruz, Rivaldo Venâncio; da diretora do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), Valdiléa Veloso; do diretor do IOC/Fiocruz, José Paulo Gagliardi Leite; do chefe-substituto do Laboratório de Vírus Respiratório e Sarampo, Fernando do Couto Motta; da representante da Coordenação-Geral de Laboratórios (CGLAB/SVS/MS), Miriam Teresinha Livorati; além de representantes do Instituto Adolfo Lutz (IAL) e Instituto Evandro Chagas (IEC), que atuam na rede de referência em diagnóstico para vírus respiratórios liderada pelo IOC/Fiocruz. 

Durante o encontro, os secretários visitaram as instalações do Laboratório, alinharam procedimentos técnicos de diagnóstico, como métodos e prazos, e discutiram o atual cenário do novo coronavírus no mundo. 

Representantes da Fiocruz e do MS discutiram o atual cenário do novo coronavírus no mundo (foto: Josué Damascena, IOC/Fiocruz)

Para o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson Oliveira, a visita permitiu o fortalecimento da rede de Laboratórios de Referência. “Estamos unindo esforços, por meio do Ministério da Saúde, Anvisa e Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde, para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde [SUS]. As atividades da Fiocruz apoiam as ações do Centro de Operações de Emergência da pasta”, enfatizou.

“É muito importante notar que o Brasil, por intermédio do Sistema Único de Saúde, já tem uma experiência bastante consolidada no enfrentamento de emergências sanitárias”, reforçou o chefe de gabinete da Fiocruz, Valcler Rangel.

Durante o encontro, os secretários visitaram as instalações do Laboratório, alinharam procedimentos técnicos de diagnóstico, como métodos e prazos (foto: Josué Damascena, IOC/Fiocruz)

Para Fernando Motta, vice-chefe do Laboratório do IOC/Fiocruz, o trabalho em conjunto desenvolvido com o Ministério da Saúde e os centros de referência regionais tem sido fundamental para o reforço da vigilância. “Seguindo nosso compromisso de atender prontamente às necessidades da sociedade brasileira, o Centro de Referência Nacional em Vírus Respiratórios da Fiocruz está preparado para responder a mais esta situação de saúde pública que demanda nossos esforços”, frisou. 

Nos próximos dias, especialistas do Instituto Adolfo Lutz e Instituto Evandro Chagas serão capacitados para realização de diagnóstico específico do novo coronavírus.

Na tarde desta quinta-feira (30/1), a Fiocruz recebe a visita do assessor regional para Doenças Virais da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS), Jairo Méndez, que discutirá o treinamento de equipes técnicas de países do Cone Sul sob representação da Opas. 

Crédito: Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) – disponível na internet 02/03/2020

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