A nova revolta da vacina

0
213

Butantan expõe cronologia de informações enviadas à Anvisa sobre evento adverso.

STF: Anvisa deve informar, em 48 horas, motivação para a suspensão dos testes da CoronaVac.

Anvisa diz que suspensão dos testes da CoronaVac foi ‘técnica’ e baseada na falta de informações.

“Butantan e Anvisa são inimigos”, lamenta fundador da agência


Butantan expõe cronologia de informações enviadas à Anvisa sobre evento adverso

 

O Instituto Butantan disse em nota na noite desta terça-feira (10) que comunicou todos os dados sobre o evento adverso grave durante os testes clínicos da Coronavac à Anvisa. 

De acordo com o comunicado, o órgão enviou a notificação em 6 de novembro e, novamente, na tarde de segunda (9) após solicitação.

O Butantan também deu mais informações sobre o acontecido. De acordo com o texto, o participante dos ensaios foi encontrado morto 25 dias após receber uma dose da vacina ou placebo. A notificação enviada à agência reguladora concluía que “o óbito não era relacionado à vacina em teste”, diz a nota.

Mais cedo, a diretoria da Anvisa declarou, em entrevista coletiva à imprensa, que os dados da notificação não detalhavam qual era o evento adverso que havia ocorrido. 

Eles também apresentaram uma linha do tempo dos eventos que levaram à interrupção, na qual não constava essa resposta do Butantan na tarde de segunda. 

O Instituto disse ainda que, na noite de segunda, recebeu um convite para uma reunião emergencial com a Anvisa, que não especificava qual era o assunto e se era relacionado ao caso. 

“Por fim, o Instituto Butantan esclarece que permanece, assim como sempre permaneceu, à disposição da agência reguladora para todos os esclarecimentos e disponibilização das informações que julgar pertinentes”, finaliza o texto. 

A linha do tempo da Anvisa 

29 de outubro: morte do voluntário dos estudos de fase 3 da Coronavac.

6 de novembro: Instituto Butantan enviou informação da morte do voluntário, que não chegou à Anvisa e, função de problemas técnicos causados pelo ataque hacker a diversos órgãos públicos brasileiros.

9 de novembro (18h): Anvisa recebe comunicação oficial do Instituto Butantan.

9 de novembro (20h47): comunicação eletrônica enviada pelo Instituto Butantan.

9 de novembro (21h25): publicação no portal da Anvisa sobre a suspensão dos estudos da fase 3 da Coronavac.

A linha do tempo do Instituto Butantan

30 de outubro: o Hospital das Clínicas da USP informa a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e a Farmacovigilância do Instituto Butantan (patrocinador do estudo) sobre a morte do voluntário;

6 de novembro: Insittuto envia notificação à Anvisa;

9 de novembro (15h): Butantan recebe ofício da Anvisa solicitando informações sobre eventos adversos graves inesperados entre os dias 30 de outubro e 9 de novembro;

9 de novembro (18h13): Butantan recebe um email reiterando o pedido anterior. Onze minutos depois, o Instituto envia a resposta por email e encaminha a cópia das notificações ocorridas no período solicitado e que já haviam sido encaminhadas via sistema à Anvisa no dia 6 de novembro, de acordo com a nota;

9 de novembro (20h47): Anvisa envia convite de reunião emergencial sem especificar assunto;

9 de novembro (21h04): Anvisa envia um novo ofício comunicando a interrupção dos estudos;

9 de novembro (21h25): publicação no portal da Anvisa sobre a suspensão dos estudos da fase 3 da Coronavac.

Veja a nota do Butantan na íntegra:

O Instituto Butantan informa que nos primeiros dias do mês de outubro, o(a) participante dos ensaios clínicos recebeu dose da vacina/placebo conforme regra do estudo. Após 25 dias, aproximadamente, ele foi encontrado sem vida. O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, centro de estudo do qual fazia parte a pessoa em questão, foi notificado no dia seguinte, quando iniciou a apuração do caso.

No dia 30 de outubro, o HC informou a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e a Farmacovigilância do Instituto Butantan (patrocinador do estudo). No dia 6 de novembro, dentro do prazo, a farmacovigilância do Instituto Butantan comunica a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), conforme preconizado em protocolo oficial. Na conclusão constava que o óbito não era relacionado à vacina em teste.

No dia 9 de novembro, o Instituto Butantan recebeu um ofício às 15h por meio de caixa postal, ferramenta mantida dentro do sistema da Anvisa, solicitando informações sobre eventos adversos graves inesperados entre os dias 30 de outubro até 9 de novembro.

No mesmo dia, às 18h13, o Instituto recebeu um e-mail da agência reguladora reiterando o ofício e solicitando o envio das informações, caso estivessem disponíveis. Às 18h24 o Butantan envia resposta por e-mail e encaminha a cópia das notificações ocorridas no período solicitado e que já haviam sido encaminhadas via sistema à Anvisa no dia 6 de novembro.

Na noite do dia 9 de novembro, às 20h47, o Butantan recebe um e-mail convite para uma reunião emergencial na manhã de hoje (10). O assunto não foi especificado ou se seria relacionado aos documentos encaminhados.

Às 21h04, um novo ofício foi depositado pela Anvisa na caixa postal do sistema, informando sobre a suspensão do estudo. Às 21h25 a Anvisa enviou um comunicado para a imprensa informando sobre a interrupção dos estudos clínicos.

Por fim, o Instituto Butantan esclarece que permanece, assim como sempre permaneceu, à disposição da agência reguladora para todos os esclarecimentos e disponibilização das informações que julgar pertinentes.

@Anna Satie, da CNN – disponível na internet 11/11/2020


STF: Anvisa deve informar, em 48 horas, motivação para a suspensão dos testes da CoronaVac

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) preste, em 48 horas, informações sobre os critérios utilizados para proceder aos estudos e experimentos referentes à vacina desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac Biotech em parceria com o Instituto Butantan, e sobre o estágio de aprovação desta e das demais vacinas contra a Covid-19. A determinação levou em conta a recente decisão da agência, responsável pela concessão de registro dos imunizantes disponibilizados ou comercializados no País, de suspender os testes da vacina, conhecida como CoronaVac.

A decisão foi tomada nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs 754 e 756). O ministro, que também é relator de outras duas ações ajuizadas por partidos políticos sobre a vacinação da população contra a Covid-19, destacou o relevante interesse público e coletivo discutido nas ações e a disposição constitucional (artigo 196) de que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco à doença e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

As ações foram ajuizadas depois que o presidente da República, Jair Bolsonaro, anunciou que a vacinação contra a Covid-19 não será obrigatória no Brasil e que o país não irá adquirir a CoronaVac. Entre os pedidos formulados estão o de que o STF fixe a orientação de que compete aos estados e aos municípios determinarem a realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas no combate à pandemia da Covid-19 e de que o governo assine protocolo de intenção de compra da 46 milhões de doses da vacina, conforme anunciado pelo Ministério da Saúde.

STF 11/11/2020


O diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, disse nesta terça-feira (10) que a decisão de suspender os testes da vacina CoronaVac foi “técnica” e baseada no fato de que as informações repassadas pelo Instituto Butantan eram “insuficientes” e “incompletas”.

A CoronaVac é desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac. O governo de São Paulo acordou a compra de 46 milhões de doses e a produção do imunizante pelo Instituto Butantan, que também coordena os testes no Brasil.

Após a suspensão, o presidente Jair Bolsonaro comemorou o que considerou uma vitória sobre João Doria, governador de São Paulo.

A causa morte do voluntário da CoronaVac foi suicídio. A informação foi divulgada pelo UOL e pelo jornal “O Estado de S. Paulo” e confirmada pela TV Globo no início da tarde desta terça.

Polêmica sobre envio de dados

O diretor-presidente da Anvisa disse que ainda aguarda dados completos e que a suspensão está mantida até que todas as informações sejam prestadas. Torres afirmou que os testes só serão retomados após uma análise do caso por um comitê internacional independente de segurança.

“Documentos claros, precisos e completos precisam ser enviados a nós, o que não aconteceu”, disse Torres. “O que recebemos ontem não nos dava nenhuma outra alternativa.”

Mais cedo, o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou que “todos” os dados foram fornecidos à Anvisa.  “O efeito adverso grave (…) não tem relação com a vacina. Não podemos dar detalhes a vocês porque isso envolve sigilo. (…) O que eu afirmo a vocês é que esses dados estão todos nas mãos da Anvisa, estão todos fornecidos à Anvisa” – Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan 

Informação sobre o suicídio

Durante a entrevista nesta tarde de terça, o diretor-presidente da Anvisa foi perguntado se o Butantan informou que a causa da morte do voluntário foi suicídio.

Torres afirmou que não era função da Anvisa procurar novamente o Butantan, e que as informações completas precisam ser enviadas pelos canais oficiais por um comitê independente. O diretor-presidente da Anvisa citou como exemplo o trâmite realizado pelos desenvolvedores da vacina de Oxford, que acionaram o comitê e teriam enviado os dados de forma completa para reverter a suspensão adotada em setembro.

Árbitro e disputa política

O diretor-presidente da Anvisa ressaltou ainda que a agência não é parceira de nenhum desenvolvedor laboratório ou instituto, mas, sim, o “árbitro” na análise dos procedimentos. “A imagem que coloco é a do árbitro entre aquilo que foi feito certo e ao arrepio da norma e emite seu juízo de valor”, afirmou Torres.

Sobre a alegação do Instituto Butantan de que a suspensão dos testes causou estranheza, o presidente da Anvisa argumentou que se trata de uma obrigação da agência paralisar os procedimentos na ausência de informações completas sobre eventos adversos.

“Quem se surpreende com uma decisão tomada por nós está se surpreendendo com algo que é óbvio. É nosso dever tomar decisões, não tomar é prevaricação. Não faremos. Iremos decidir, no momento certo, na hora certa, diante de documentos que nos respaldem, ou na ausência deles conforme aconteceu ontem”, disse Torres.

Torres não quis comentar as declarações do presidente Bolsonaro, em uma rede social, de que o episódio da suspensão dos testes é mais um em que “Jair Bolsonaro ganha”.

Desde o início da pandemia, Bolsonaro tem divergido do governador de São Paulo, João Doria, a quem o Instituto Butantan, vinculado à Secretaria de Saúde de São Paulo, é subordinado.

Anvisa suspende temporariamente teste da vacina CoronaVac, que será produzida no Butantan

Histórico da interrupção

A Coronavac é uma das quatro candidatas a vacina contra o novo coronavírus (Sars-CoV-2) que estão sendo testadas no Brasil. O governo de São Paulo firmou acordo com o laboratório chinês Sinovac para compra de 46 milhões de doses e para transferência de tecnologia para o Instituto Butantan.

De acordo com a Anvisa, a interrupção foi determinada nesta segunda-feira (9) por causa de um “evento adverso grave”. Ainda na noite de segunda-feira, o diretor do Butantan, Dimas Covas, disse em entrevista à TV Cultura estranhar a decisão da Anvisa e afirmou que o evento adverso, um óbito, não está relacionado com a vacina.

Ataque cibernético e atrasos

A Anvisa afirmou que o evento adverso, que na verdade trata-se da morte do voluntário, ocorreu em 29 de outubro e foi notificada dentro do prazo. O comunicado foi enviado em 6 de novembro, mas não foi recebido por causa de ataques cibernéticos que afetaram sistemas do governo federal.

Ainda segundo a Anvisa, em 9 de novembro a agência recebeu, às 18h, uma segunda comunicação do Instituto Butantan. Pouco tempo depois, após reunir um corpo de especialistas, às 20h47 a Anvisa enviou comunicado para o instituto determinando a suspensão do estudo.

@Fernanda Calgaro e Paloma Rodrigues, G1 e TV Globo, disponível na internet 11 /11/2020

“Butantan e Anvisa são inimigos”, lamenta fundador da agência

Sanitarista Gonzalo Vecina avalia que politização da vacina fechou o canal existente entre a autoridade sanitária e o instituto de pesquisa. Caso estivesse à frente da agência, Vecina diz que também suspenderia os testes. Mas liberaria após ouvir as explicações

Fundador e ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o sanitarista Gonzalo Vecina Neto disse que a agência deveria ter dialogado com o Instituto Butantan antes de suspender os testes da CoronaVac, vacina contra o novo coronavírus. O imunizante está sendo desenvolvido pelo Butantan em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.

“A Anvisa poderia ter dialogado com o Butantan, e o Butantan poderia ter dialogado com a Anvisa. Mas esse canal, pelo visto, acabou. O Butantan e a Anvisa são inimigos. E aí, isso vai prejudicar o Brasil e a vacina. Esse clima foi criado pelo Bolsonaro, de um lado, e pelo Doria (João Doria, governador de São Paulo) do outro. Isso está claro: tem dois lados envolvidos nessa peleja que não tem a ver com a busca de uma solução para a sociedade brasileira”, afirmou ao Correio.

A situação teve início com a morte de um voluntário que, depois se soube, boletim de ocorrência da Secretaria de Segurança Pública de SP apontou que a causa foi suicídio. O Butantan, na manhã desta terça-feira (10), frisou que a morte não tinha relação alguma coisa a vacina, e que havia enviado informações à Anvisa na sexta-feira. A Anvisa, por sua vez, disse que não recebeu informações detalhadas sobre o caso, e que só soube da situação na segunda-feira (9), devido a um problema do sistema.

A todo momento, o diretor-presidente da agência, Antonio Barra Torres, frisou que a decisão foi técnica. Apesar de já ter a informação sobre a causa da morte, ele afirmou que iria aguardar dados completos e que os testes seriam retomados apenas após uma análise do Comitê Internacional Independente. A politização, no entanto, dominou o debate público no momento em que o presidente Jair Bolsonaro comemorou a paralisação dos testes e anunciou uma vitória sobre João Doria. Adversário político do presidente, o governador tucano anunciou a chegada de 120 mil doses da CoronaVac para o estado de SP.

Se estivesse na Anvisa, Vecina Neto disse que também teria tomado a decisão de suspender os testes. Mas ressaltou que após informações sobre a causa, “não há dúvida de que o estudo tem que prosseguir”. Para ele, ainda que a agência tenha pontuado a necessidade de um posicionamento do comitê, pela urgência do assunto, talvez não fosse o caso de esperar isso.

Ainda assim, o fundador da agência se diz confiante com a independência da Anvisa. “Acho que o presidente honra o diploma dele, e os servidores, com certeza, estão fazendo o possível para preservar o capital de credibilidade que a Anvisa tem no Brasil e no mundo. Eu acho, e quero acreditar, que todos estão trabalhando para manter a credibilidade que a Anvisa conquistou. Não acredito que esteja se entregando a qualquer tipo de chantagem política”, disse.

@Sarah Teófilo/Correio Braziliense – disponível na internet 11/11/2020

DEIXE SEU COMENTÁRIO

Por favor, insira seu comentário!
Por favor, digite seu nome!