Depois da tempestade, a recuperação? O que grandes instituições esperam para a economia brasileira em 2021

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Economia se recuperando com retomada da atividade após o tombo em 2020 com a pandemia do coronavírus, taxa básica de juros subindo, mas ainda a níveis bastante baixos em termos históricos, inflação controlada. O ano de 2021 promete trazer boas novas para a atividade brasileira, de acordo com estimativas de grandes bancos e casas de análise compiladas pelo InfoMoney.

Porém, isso não quer dizer que não haja grandes desafios e motivos de cautela para a economia, com destaque para a questão fiscal. Isso após um ano de fortes gastos, de cerca de 8% do Produto Interno Bruto (PIB), para conter o impacto do avanço da pandemia por meio de programas de auxílio que foram tão importantes para que o tombo do PIB este ano, mas agravando um dos maiores problemas para o país.

A XP Investimentos destaca ainda que o primeiro grande tema do ano é o comportamento da economia com o fim dos programas governamentais, que impulsionaram a recuperação em “V” do consumo no segundo semestre de 2020. 

“Nossos casos otimistas e pessimistas são fortemente dependentes do equilíbrio fiscal e do desenvolvimento de vacinas. No ambiente otimista, a ampla disponibilidade de vacinas ocorre no primeiro trimestre de 2021, enquanto o Brasil mantém seu regime fiscal intacto e faz um bom progresso na agenda de reformas no próximo ano. A estrutura do limite de gastos é fortalecida por meio de cortes e abre espaço para novos gastos sociais abaixo do limite. O progresso abrangente na agenda de reforma mais ampla fortalece ainda mais as perspectivas, o que implica taxas de juros e inflação mais baixas por mais tempo”, avaliam.

Já no cenário pessimista, os problemas com a Covid-19 se estendem e a recuperação gradual da atividade não é suficiente para criar os empregos necessários e nem para diminuir a pressão social, e as autoridades decidem continuar com o Orçamento de Guerra e descartar todas as regras fiscais, levando à instabilidade e à depreciação do real. Isso forçaria o Banco Central a aumentar as taxas, afetando ainda mais a recuperação.

No cenário base do banco, a economia cresce 4,3%, o o que deve ajudar a levar o PIB aos níveis anteriores à Covid até o terceiro trimestre de 2021. Para os economistas, a demanda externa contribui e a demanda interna é ajudada por um ambiente de taxas de juros baixas. Tanto o investimento como o consumo privado aumentam a recuperação, enquanto o gasto público não deve ser um vetor importante para o crescimento. Se as regras fiscais permanecerem em vigor e houver ampla disponibilidade de vacinas no segundo trimestre de 2021, a expectativa é de um crescimento também em 2022, de 2,7%, com riscos de queda nas projeções decorrentes da incerteza relacionada às eleições presidenciais e do grau de progresso com a agenda de reformas em 2021.

Questão é o fiscal

Conforme destacado acima, o fiscal é um dos maiores desafios impostos nos últimos anos – e que a pandemia só agravou. A expectativa é de um novo ano de déficit, mas as previsões variam sobre qual será o peso da dívida para a economia brasileira.

Pelo cenário traçado pelo Ministério da Economia, o Brasil deve acumular 13 anos de rombos sucessivos nas contas públicas. Com despesas maiores que receitas desde 2014, o país deve manter essa tendência até 2026. As contas públicas só devem voltar ao azul em 2027.

Segundo o Credit Suisse, apesar da perspectiva mais positiva para o crescimento econômico em 2021 e 2022 e, consequentemente, para a dinâmica das contas fiscais, a trajetória da dívida bruta como percentual do PIB seguirá em trajetória de alta no nos próximos anos.

A incerteza, na verdade, começa antes, com os casos de contaminação e hospitalização pela Covid-19 tendo acelerado nas últimas semanas. “A extensão desse impacto depende da evolução desta nova fase da pandemia, difícil de prever”, avalia a XP. Depende também do início da vacinação que, na avaliação da equipe de análise, acontece no primeiro trimestre de 2021. Mas há risco de execução, por questões logísticas e pelo fato de ainda não termos claro qual vacina chegará primeiro ao Brasil em condições de ser disponibilizada ao grande público.

Quanto aos motores do crescimento, por um lado o fim dos programas de transferência de renda e de suporte ao emprego devem reduzir a percepção de renda das famílias. Por outro, a avaliação é de que recuperação em curso do mercado de trabalho e a poupança circunstancial feita pelas classes médias e alta durante a pandemia deve permitir que o consumo avance mais do que a renda. A política monetária bastante expansionista também deve ajudar a impulsionar a demanda doméstica, através de um mercado de crédito que continua a apresentar sinais positivos para o próximo ano.

Como resultado, a XP espera que o consumo agregado, assim como o PIB, siga em expansão ao longo de 2021, mas em ritmo significativamente mais lento do que no segundo semestre do ano passado, quando a economia registrou uma recuperação após o tombo no primeiro semestre. A previsão é de alta da atividade em 3,4%, ainda sem recuperar o tombo projetado de 4,6% de 2020.

Já o Safra, que tem expectativa de alta de 4,4% da atividade este ano após a baixa de 4,1% no ano passado, espera que o país deva apresentar uma mudança na composição do crescimento em 2021, com uma expansão mais forte do setor de serviços. Isso deve favorecer a retomada do emprego e do consumo, especialmente no segundo semestre, avalia.

Para os economistas do banco, o ambiente internacional também deve ser propício à economia brasileira, com a normalização das correntes de comércio internacional, em virtude da vacinação já iniciada nas principais economias do mundo. A maior variação positiva está prevista para a indústria, que deve crescer 6,5% no próximo ano, segundo a equipe. A agropecuária, por sua vez, deve ter alta de 2,2%, e serviços devem subir 3,8%. A projeção é de alta de 9,6% para o PIB da construção civil, beneficiada pelo baixo nível das taxas de juros no país.

Em um ambiente incerto e ainda muito dependente de vacinas, o Morgan Stanley traçou três cenários para a economia brasileira: o mais provável, em que projeta alta de 4,3% do PIB, o mais otimista, com alta de 5,5% da atividade, enquanto o pessimista aponta para alta de 2,1% da economia no ano.

Os analistas apontam a questão fiscal como o principal tema para os próximos dois anos no País. Eles esperam que o governo permaneça comprometido com o teto de gastos e a aprovação de reformas emergenciais, o que deve permitir ao governo recuperar alguma credibilidade fiscal até que as outras reformas na área sejam feitas.

Na avaliação do Credit, o cumprimento do teto de gastos não é suficiente para que a dívida bruta se estabilize nos próximos anos. A estabilidade da dívida exigiria uma combinação de baixas taxas de juros reais e crescimento moderado do PIB nos anos seguintes. Se a taxa real de juros for de 2,5% nos próximos anos, o PIB médio precisaria crescer 2% ou mais para levar à estabilidade. Já se o crescimento do PIB permanecer constante em 2%, a estabilidade da dívida bruta ocorrerá somente em 2030.

Já para o Safra, a dívida bruta deve equivaler a 89,1% do PIB em 2020 e a 89% em 2021, ano em que o déficit primário deve recuar de 9,9% para 2,3% do PIB.

O Itaú também tem uma percepção de queda na dívida bruta como proporção do PIB nos próximos anos, devendo alcançar  84% do PIB em 2021 e 83% do PIB em 2022, ante 74,3% em 2019 e previsão de chegar a 89% em 2020.

“Além da revisão da série histórica do PIB, que reduziu a relação dívida/PIB em cerca de 1,5 ponto percentual diante do último cenário, os melhores resultados primários, o crescimento econômico temporariamente acima do potencial, os juros reais abaixo do patamar neutro e um deflator do PIB acima do IPCA beneficiarão a dívida nos próximos anos. No caso de flexibilização do rigor fiscal, a retomada da economia ficaria prejudicada e a manutenção da taxa de juros próxima
às mínimas históricas poderia ser inviabilizada”, avaliam os economistas do banco.

De qualquer forma, os economistas não veem, o Brasil como um “país quebrado”, declaração esta dada na última terça-feira (5) pelo presidente Jair Bolsonaro a um apoiador na saída do Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência. Contudo, como definiu Mansueto Almeida, secretário do Tesouro, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, não há muito mais espaço de manobra.

“A situação é a seguinte: hoje, o Brasil não pode abrir mão de R$ 1 de receita e ainda tem de se esforçar para recuperar neste e nos próximos anos a receita que perdeu com a crise da covid-19 na queda do PIB e na arrecadação”, avaliou. Vale destacar que, um dia após a declaração, Bolsonaro voltou atrás e falou que o país está uma “maravilha”.

Cenário para inflação e política monetária

Enquanto isso, o cenário para 2021 é de uma inflação relativamente controlada, com as previsões variando entre 3,35% e 4,3%. Ou seja, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país, ao redor do centro da meta, de 3,75%, com intervalo de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo no ano (ou entre 2,25% e 5,25%).

Conforme destaca a XP Investimentos, após uma elevação dos preços de alimentos em 2020, há razões para acreditar que esse movimento deve arrefecer em 2021. A apreciação recente do câmbio alivia a pressão de custos internacionais e o fim dos programas emergenciais contribui para desacelerar a demanda interna, mesmo com a gradual melhora no mercado de trabalho. Já a a distribuição de insumos industriais deve se normalizar diante. A expectativa da casa é de um IPCA de 3,5% em 2021, após atingir 4,5% em 2020. 

Alberto Ramos, diretor de pesquisa econômica para América Latina do Goldman Sachs, destacou em entrevista ao InfoMoney que, apesar da inflação de alimentos alta em 2020 (rodando em cerca de 18% em termos anuais), o Brasil não parece ter um problema de inflação alta e esses choques provavelmente vão moderar durante 2021.

A expectativa do Goldman é que os preços administrados subam em 2021 e que os preços de serviços, muito impactados pela pandemia, também tenham uma recuperação. Mas, por outro lado, preço de alimentação e de bens industriais certamente vão moderar um pouco em 2021.

Com isso, em relação à política monetária do Banco Central, para 2021, a previsão do economista é de uma alta entre 1 ponto e 1,5 ponto percentual da Selic no ano, a partir do segundo semestre, levando a Selic para o patamar entre 3% e 3,5%.

“Há duas questões diferentes para definir a política monetária: i) para onde vai a inflação em relação à meta e ii) manejo de risco. Sobre o segundo ponto, manter o juro real muito baixo pode gerar uma volatilidade financeira, uma pressão no câmbio. Deste modo, há considerações do ponto de vista financeiro e de estabilidade macroeconômica que podem requerer uma política monetária menos acomodativa, independentemente de como esteja o nível da inflação. Dada a incerteza macroeconômica, é difícil ter certeza sobre a calibragem fina da política monetária, mas não me parece que inflação saia do eixo e gere muita pressão sobre a política monetária”, avalia Ramos.

Para os analistas do Credit, a inflação deve permanecer em torno de 4% em 2021, impulsionada por um repasse da forte depreciação da taxa de câmbio, retomada da demanda e a implementação de aumentos de preços anteriormente adiados ou cancelados. Com isso, o banco espera que a normalização dos preços de serviços e da indústria deve continuar e a inflação de alimentos deve permanecer pressionada, levando a uma forte alta do IPCA no primeiro semestre de 2021, batendo 6,7% em maio, para depois começar a perder força entre julho e dezembro.

Além disso, para os próximos meses, os analistas do banco esperam uma “normalização gradual” da política monetária. Com a recuperação da economia, a projeção é que o Banco Central aumente os juros, com a Selic chegando a 4,5% no fim de 2021 e em 6% em 2022. Esta alta da taxa básica de juros deve ter início no meio do próximo ano, momento em que o Credit também vê a inflação atingindo níveis mais altos. Mas mais que a alta de preços, os analistas enxergam esse início de novo ciclo pelo BC puxado pela recuperação da economia nacional.

Confira as projeções de grandes bancos e casas de análise para os indicadores da economia brasileira em 2021: 

Instituição PIB  IPCA  Selic (final do ano)   Câmbio (final do ano)
Morgan +4,3% 4% 3% R$ 5,30
XP Investimentos +3,4% 3,5% 3% R$ 4,90
Itaú +4% 3,3% 3,5% R$ 4,75
Bradesco +3,9% 3,3% 4% R$ 5,00
Santander +2,9% 3% 2,5% R$ 4,60
Credit Suisse +4% 4% 4,5% R$ 5,20
Safra +4,4% 3,2% 3% por volta de R$ 5,00
Goldman Sachs +3,8% a +4% 3,7% 3% a 3,5% R$ 4,80
Bank of America +3% 4,4% 3,25% R$ 5,10
BB Investimentos +3,5% 3,4% 3% R$ 5,00
UBS +3% 4,3% 4% R$ 5,00
SulAmérica Investimentos +3,6% 3,35% 3% R$ 5,19

Câmbio: dólar abaixo de 5?

Apesar de passar por uma forte queda no fim do ano passado, o dólar encerrou 2020 com valorização de 29% ante o real, deixando a moeda brasileira entre uma das piores do mundo. Além do fiscal, o forte avanço da Covid 19 consolidou o Brasil como um dos países mais afetados pela pandemia no mundo, enquanto o segundo semestre foi de maior queda da moeda americana em um cenário de grande liquidez global e avanço no desenvolvimento de vacinas contra o coronavírus. Mas os fatores de risco devem seguir no radar dos investidores, o que deve movimentar o câmbio no ano que começa.

Há cerca de um mês, Ana Paula Vescovi, economista-chefe do Santander, destacou em evento que o cenário do dólar é binário, dependendo desse fator. Se o governo seguir a trajetória de afirmar a responsabilidade fiscal e a macroeconômica, há espaço para o dólar chegar a R$ 4,60. Por outro lado, se o governo não conseguir dar uma demonstração clara sobre como vai endereçar a questão da dívida pública, a moeda americana poderá atingir R$ 6,70, segundo ela.

Apesar disso, o cenário-base da economista é de um câmbio mais baixo em meio a um cenário internacional favorável e redução de riscos fiscais, que poderão reduzir os prêmios de ativos brasileiros em geral, levando o real a se fortalecer de forma mais pronunciada. As projeções do Santander são de dólar a R$ 4,60 este ano e R$ 4,15 em 2022.

O Bank of America, por sua vez, diz estar “cautelosamente otimista” com relação ao real, citando valuations “atrativos” e expectativa de maior clareza sobre o cenário fiscal no primeiro trimestre de 2021.

“Acreditamos que há espaço para remover algum prêmio de risco no primeiro trimestre de 2021, à medida que o governo dá mais clareza sobre as perspectivas fiscais. Em nosso cenário-base, o teto de gastos permanecerá em vigor ao longo de 2021 e a agenda de reformas avançará, o que seria positivo para o real”, disseram em relatório Gabriel Tenorio e Claudio Irigoyen, que também consideram o risco fiscal o principal motor da desvalorização de 29% da moeda brasileira no ano passado.

Para o BB Investimentos, que prevê o dólar a R$ 5, superada a crise sanitária, a expectativa é de que o país retome as discussões em torno da agenda de consolidação fiscal, o que deve contribuir para a redução das incertezas que pairam sobre a sustentabilidade fiscal do Brasil no longo prazo, o que pode gerar uma pressão de queda para o real. Mas, dado o cenário de juros domésticos mais baixos,  o câmbio tende a se estabilizar em um patamar mais elevado em relação à média dos últimos anos. 

As previsões apontam para um 2021 melhor do que ano que passou. Porém, é preciso considerar os riscos no radar. “[A pandemia] torna difícil modelar o crescimento porque não é o tipo de choque tradicional da economia, é algo que acontece uma vez a cada cem anos. Esse nível de incerteza significa que o leque de crescimento possível para 2021 é bem mais amplo”, na avaliação de Ramos, do Goldman Sachs.

“Estamos operando com um grau de incerteza muito elevado, que se soma à própria incerteza relacionada ao processo legislativo, ao ajuste fiscal e à governabilidade. Será um ano complicado, de grande volatilidade”, aponta o economista.

Crédito: Lara Rizério/InfoMoney – @internet 11/01/2021

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