A nova estrutura anunciada no fim da semana passada pelo Planalto para melhorar as relações com o Congresso assume com um desafio: o novo ministro da Secretaria de Governo, o general Luiz Eduardo Ramos , que assumirá a articulação política no lugar do ministro da Casa Civil,Onyx Lorenzoni , tem em mãos indicações feitas por parlamentares para cargos nos estados que até agora não saíram do papel.
O GLOBO levantou que ao menos 75 nomes foram indicados à Casa Civil desde março, quando o próprio governo sinalizou que gostaria de receber a sugestão de nomes técnicos para preencher cargos. Todas as ideias foram ignoradas pelo Planalto até o momento.
Há indicações de parlamentares de cargos nos estados em órgãos como Ibama, Funasa, Incra, Codevasf, Secretaria de Patrimônio Urbano e outros braços dos ministérios.
A demora em efetivar as demandas acertadas com parlamentares são apontadas por congressistas como um dos motivos que dificultam o clima para o Planalto entre deputados e senadores. O governo vem sofrendo derrotas sucessivas e nesta semana pode ver ser rejeitado pela Câmara o decreto das armas, uma das bandeiras de campanha do presidente Jair Bolsonaro.
A responsável por coletar as indicações é Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso. Ela reclamaa interlocutores que o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, não conseguia fazer valer o poder de sua caneta e que um dos problemas é o fato de outros ministros não aceitarem as indicações. A deputada também ressalta que há um processo rigoroso de seleção e que as nomeações seguem os critérios do decreto do “banco de talentos”, que exige ficha limpa e experiência.
Para não negociar com a cúpula dos partidos, a Casa Civil havia optado por pedir aos coordenadores de bancadas estaduais no Congresso para compilar os nomes em seus estados. O ex-coordenador do Maranhão, Hildo Rocha (MDB), conta que enviou uma lista de doze nomes há mais de um mês. Nenhum foi nomeado, sem que houvesse uma justificativa para o parlamentar.
— Não teve nada. Que eu saiba, do Maranhão, nenhum foi nomeado. Não rolou nada, zero. O governo precisa parar de prometer e não entregar.
Os coordenadores das bancadas de Rondônia e Espírito Santo fazem coro às reclamações — suas indicações também não andaram no governo federal.
— Está tudo parado, não foi nomeado ninguém — diz Lucio Mosquini (MDB), coordenador da bancada de Rondônia — Está demorando muito e os parlamentares acabam desistindo, porque dá mais problema do que resultado. Ninguém está atrás de carguinho. O governo vai perdendo esse compromisso de alinhamento quando não cumpre a parte dele.
— Isso tem incomodado, porque eu virei interlocutor do governo e gerei uma expectativa de algo que foi discutido em março e não foi para frente — diz Da Vitória (Cidadania), coordenador do Espírito Santo. — Nunca vi em lugar nenhum um tempo de avaliação como esse. Compromisso é algo sério, só devemos fazer se for cumprir.
Coordenador da bancada do Rio de Janeiro, o deputado Hugo Leal (PSD) diz que foi apresentado a uma planilha de cargos regionais pelo governo e fez encaminhamentos de pedidos de colegas.
— Eu fazia o encaminhamento. A informação que eu tenho de pessoas mais próximas ao governo é que não saiu nada. Mas também não é minha função monitorar. Passei para pessoas mais próximas ao governo.
O presidente Jair Bolsonaro demitiu em 8 de abril Ricardo Vélez Rodríguez do Ministério da Educação. O anúncio foi feito pelo Twitter. Decisões polêmicas, como a revisão dos livros didáticos sobre o golpe e a ditadura militar e uma orientação para que as escolas filmassem os alunos cantando o hino, fizeram com que críticas recaíssem sobre a gestão.
Santos Cruz
Jair Bolsonaro demitiu em 13 de junho Carlos Alberto dos Santos Cruz da Secretaria de Governo da Presidência. A decisão foi atribuída por um auxiliar do presidente a uma “falta de alinhamento político-ideológico” e embates com outros integrantes do governo. Ele foi alvo constante de Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) e da ala ideológica do governo.
Gustavo Bebianno
O porta-voz da Presidência da República confirmou a demissão de Gustavo Bebianno da Secretaria-Geral em 18 de fevereiro. O processo de desgaste começou com denúncias de supostas irregularidades na sua gestão à frente do caixa eleitoral do PSL e chegou ao estopim quando ele foi chamado de mentiroso por Carlos Bolsonaro. Ele nega as acusações.
Luiz Tozi
Uma guerra entre a ala ideológica, militares e quadros técnicos no Ministério da Educação levou a uma sucessão de baixas. Antes de ser demitido, o então ministro Ricardo Vélez Rodríguez exonerou seu próprio secretário-executivo, Luiz Tozi.
Ricardo Vieira
O cargo de secretário-executivo do MEC foi assumido pelo militar Ricardo Machado Vieira, que saiu com a chegada do atual ministro, Abraham Weintraub. O novo titular da pasta exonerou cinco secretários setoriais trazidos pelo ex-ministro Vélez.
Marcus Vinicius Rodrigues
No Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao MEC, somente no governo Bolsonaro, houve três presidentes. O primeiro, Marcus Vinicius Rodrigues, foi demitido pelo então ministro Vélez Rodríguez após suspender a avaliação da alfabetização este ano.
Elmer Vicenzi
O cargo de presidente do Inep ficou vago cerca de um mês, até que Elmer Vicenzi, delegado da Polícia Federal, assumiu, já na gestão de Weintraub. Mas não durou 20 dias , sendo substituído pelo atual presidente, Alexandre Lopes. O Inep é responsável pelos exames educacionais do país, como o Enem.
Alecxandro Carreiro
Na Agência de Promoção das Exportações (Apex), do Ministério de Relações Exteriores, também já ocorreram duas trocas de presidente. O presidente Jair Bolsonaro confirmou em 10 de janeiro a demissão de Alecxandro Carreiro, cujo mandato durou apenas sete dias. Neste período, ele demitiu 17 funcionários e nomeou 11.
Mário Vilalva
Assumiu o posto de presidente da Apex o embaixador Mário Vilalva, que acabou demitido em 9 de abril após uma série de desentendimentos com diretores que tinham o apoio do chanceler Ernesto Araújo. Assumiu o posto o contra-almirante da Marinha Sergio Ricardo Segovia Barbosa.
Tia Eron
Ex-deputada pelo PRB da Bahia e membro da bancada evangélica, Eronildes Vasconcelos de Carvalho foi demitida em maio pela ministra Damares Alves da chefia da Secretaria de Proteção da Mulher, dois meses depois de assumir o cargo. A ministra alegou “improdutividade”, mas pessoas próximas à ex-deputada falam em retaliação.
Franklimberg de Freitas
O presidente da Fundação Nacional do Índio, Franklimberg de Freitas, perdeu o cargo por pressão da bancada ruralista. A ordem foi dada pela ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. Dias antes, ao se reunir com Sergio Moro, ele disse que ficaria no cargo. A pasta, hoje sob tutela de Damares, será devolvida ao Ministério da Justiça.
Floriano Barbosa
Floriano Barbosa, que chegou à Secretaria de Comunicação após trabalhar com Eduardo Bolsonaro, foi substituído por baixo desempenho na função. Ele era responsável pelos contratos de publicidade do Executivo. Barbosa disse que pediu para deixar o cargo por conta de “ataques” recebidos. Assumiu o posto o empresário Fábio Wajngarten.
Marco Aurélio Vieira
O general Marco Aurélio Vieira entrou em conflito com o ministro Osmar Terra (Cidadania) por discordar da nomeação de alguns políticos na sua área e acabou demitido da Secretaria de Esporte. Vieira teria atuado contra a vontade do Planalto e do próprio Terra ao estimular parlamentares a recriar a pasta do Esporte.
Teté Bezerra
As mudanças na Embratur começaram em março quando a ex-deputada Teté Bezerra pediu exoneração do cargo de presidente. No mesmo dia, Jair Bolsonaro afirmou que determinou a demissão dela em razão de um jantar da empresa que teria custado R$ 290 mil.
Paulo Roberto Senise
Paulo Roberto Senise, que assumiu o posto de Teté Bezerra, ficou menos de dez dias na presidência da Embratur. Deu lugar em maio a Gilson Guimarães Neto, que atuou na campanha de Jair Bolsonaro. O atual chefe da empresa é sanfoneiro e integra a banda de forró Brucelose.
Carlos Manato
O ex-deputado Carlos Manato (PSL-ES) foi demitido da Secretaria Especial para a Câmara da Casa Civil. Amplamente criticada por deputados e senadores, a interlocução é uma das grandes fragilidades do governo federal. Assumiu o posto Abelardo Lupion (DEM-PR), amigo do ministro Onyx Lorenzoni, que teria centralizado o trabalho de articulação política.
Marcos Barbosa Pinto
Marcos Barbosa Pinto entregou sua carta de renúncia após Jair Bolsonaro exigir que o presidente do BNDES, Joaquim Levy, o demitisse da diretoria de Mercado e Capitais. Ele havia sido chefe de gabinete de Demian Fiocca, presidente do BNDES durante o governo Lula.
Joaquim Levy
Pressionado por Jair Bolsonaro a demitir o diretor Marcos Barbosa Pinto, a quem havia indicado como diretor, Levy renunciou ao cargo de chefe do BNDES. Na véspera, o presidente havia dito que a cabeça do economista estava “a prêmio há algum tempo” e se irritado com a nomeação de “gente suspeita”.
Juarez Cunha
Jair Bolsonaro demitiu Juarez Cunha como presidente dos Correios por agir como “sindicalista” ao se reunir com deputados do PT e PSOL e se posicionar contra a privatização da estatal. Cunha, que é general da reserva, assumiu o posto durante o governo de Michel Temer.
Aliados atendidos
Há nomeações saindo a conta-gotas em alguns estados, mas de nomes ligados ao PSL, partido de Bolsonaro, ou a figuras do próprio governo. Maura Jorge, candidata do partidoao governo do Maranhão nas últimas eleições, foi nomeada na última quarta-feira para a superintendência da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) no estado. Na lista encaminhada pelo deputado Hildo Rocha, por exemplo, este era um dos cargos pleiteados.
No Rio Grande do Sul, o ministro da Casa Civil indicou um aliado, André Cecchini, para a superintendência do Grupo Hospitalar Conceição (GHC) em abril. O grupo controla um orçamento de R$ 1,5 bilhão e é um dos cargos mais cobiçados do estado. Também foram nomeados um diretor ligado ao DEM, Claudio Oliveira, e outro ligado ao MDB, Francisco Paz. O último, segundo deputados gaúchos, seria um indicado do ministro da Cidadania, Osmar Terra.
Na Bahia, o vice-líder do governo, José Rocha (PL), indicou Maria Quitéria (Avante) para a Gerência de Assuntos Estratégicos da Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba). Ligada à esquerda, foi exonerada por Onyx logo após a nomeação, em março. José Rocha, porém, contornou a situação, e Quitéria continua nomeada no cargo até o momento.
Crédito: Natália Portinari e Bruno Góes/O Globo – disponível na internet 24/06/2019