De Bem com a Vida: Cientistas identificam mecanismo que liga estresse crônico a risco cardiovascular.

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Apesar de associação já ser conhecida há tempos, estudo revelou pela primeira vez em humanos modo pelo qual a tensão afeta a saúde dos vasos sanguíneos, num caminho que vai do cérebro ao coração

. Parte de um sistema que foi fundamental para a sobrevivência humana em tempos imemoriais, o estresse é hoje um dos principais males a atingir a Humanidade. Sofrendo com o constante medo de perder o emprego, da violência, da frustração amorosa, da morte de entes queridos e outras situações com profundos efeitos psicológicos negativos, bilhões de pessoas ao redor do planeta vivem em um estado crônico de tensão que já foi relacionado a um maior risco de desenvolver diversas doenças, como o câncer e problemas cardiovasculares. Mas embora essa associação seja conhecida há muito tempo, os mecanismos como o estresse crônico eleva estas chances ainda são muito pouco compreendidos. Agora, porém, um estudo identificou pela primeira vez uma ligação direta entre a atividade em uma região do cérebro responsável pelas nossas reações emocionais e processos corporais que provocam inflamação e endurecimento dos vasos sanguíneos, o que, por sua vez, levam a episódios como infartos e derrames.

Segundo os cientistas, o caminho pelo qual o estresse aumenta o risco de doenças cardiovasculares começa pelas amídalas cerebrais – não confundir com as estruturas também chamadas amídalas, ou tonsilas palatinas, localizadas na garganta, parte do sistema imunológico e uma das primeiras linhas de defesa de nosso organismo contra patógenos (agentes causadores de doenças, como vírus e bactérias) ingeridos ou inalados. Eles descobriram que, constantemente estimuladas por situações de tensão, as amídalas cerebrais ativam a produção de células sanguíneas relacionadas a respostas inflamatórias pela medula óssea, o que acaba por afetar a saúde das artérias do coração e outras partes do corpo.

– Embora a ligação entre o estresse e as doenças do coração tenha sido estabelecida há muito tempo, o mecanismo que media esse risco nunca foi claramente entendido – lembra Ahmed Tawakol, codiretor do programa de imageamento cardíaco da Divisão de Cardiologia do Hospital Geral de Massachusetts, EUA, e principal autor de artigo sobre o estudo, publicado na edição desta semana do prestigioso periódico científico médico “Lancet”. – Estudos com animais haviam demonstrado que o estresse ativa a produção de células brancas pela medula óssea, levando à inflamação arterial, e este estudo sugere que uma via biológica análoga também existe em humanos. Além disso, o estudo identificou pela primeira vez, seja em animais ou em humanos, a região do cérebro que liga o estresse aos riscos de ataques cardíacos e derrames.

No estudo, os pesquisadores fizeram dois levantamentos complementares. No primeiro, eles analisaram dados e prontuários médicos de quase 300 indivíduos que se submeteram a exames de imagem no hospital usando um radiofármaco que permite medir tanto a atividade de regiões do cérebro quanto o estado de inflamação nas artérias. Na época dos exames, nenhum deles tinha qualquer indício de problemas cardiovasculares, e todos voltaram a se consultar com médicos pelo menos três vezes nos dois a cinco anos seguintes. Neste período, 22 deles sofreram algum evento cardiovascular, como infarto, derrame ou angina, e todos eles também estavam justamente entre os que apresentavam maior atividade das amídalas nos exames iniciais, numa relação que se manteve mesmo depois que os cientistas introduziram outros fatores de risco na análise, como tabagismo e sedentarismo. Já no segundo levantamento, os pesquisadores examinaram 13 voluntários com histórico de estresse pós-traumático com o mesmo radiofármaco, verificando que o nível de atividade das amídalas de fato se traduzia em uma maior inflamação das artérias.

Segundo o cardiologista Claudio Domênico, os resultados do estudo reforçam a importância do controle do estresse na prevenção de doenças cardíacas. Ele lembra, por exemplo, que desde 2011 a Sociedade Brasileira de Cardiologia recomenda o uso de técnicas de respiração lenta que reduzem os níveis de tensão emocional, como meditação, ioga e tai chi chuan, entre as estratégias não-farmacológicas para reduzir o risco destas doenças, ao lado, por exemplo, de melhorias na dieta e prática de exercícios.

– O estudo mostra como o estresse é cada vez mais um fator preponderante de riscos de doenças em nossa sociedade – diz. – Não há separação de mente e corpo e, por isso, a prevenção e tratamento de doenças cardiovasculares não pode ser só dar remédios, mas também melhorar os hábitos emocionais do paciente.

Crédito: Jornal O Globo – disponível na web 12/01/2017

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