Após acidentes de 2017 na Sapucaí, nenhuma nova norma de segurança para alegorias foi estabelecida

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Após o carnaval, promessa era estabelecer padrões para carros alegóricos

uase um ano depois de acidentes com alegorias terem matado uma pessoa e deixado 35 feridos na Sapucaí, as escolas de samba voltarão à Avenida sem que as autoridades de fiscalização tenham, até hoje, criado novas normas de segurança para os desfiles. Após o carnaval, a promessa era estabelecer, junto com as agremiações, padrões para construir, operar e fazer a manutenção dos carros alegóricos.

Mas o trabalho não foi concluído. E nem há previsão para terminá-lo. Por enquanto, continuam valendo as regras de sempre: vistorias nos barracões realizadas pelos bombeiros e pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio (Crea-RJ). Enquanto isso, as escolas tentam, cada uma do seu jeito, promover mudanças para não repetirem os erros que prejudicaram a folia em fevereiro passado.

Após os acidentes, o Inmetro instaurou painéis para debater a segurança dos carros, e a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) instituiu uma Comissão de Estudo Especial sobre as alegorias. Duas reuniões aconteceram no segundo semestre de 2017, com a participação dos dois órgãos e também do Crea-RJ, do Cefet-RJ e da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), além de representantes das ligas das escolas de samba do Rio e de São Paulo (as mudanças também poderiam ser levadas para os desfiles do Anhembi). Foram sugeridos textos-base sobre conceitos relacionados às alegorias, mas que não ficaram prontos.

— Haverá outros encontros, ainda sem data fixada — afirma o agente de fiscalização do Crea-RJ Mário Roberto Gomes.

Presidente da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa), Jorge Castanheira explica que o conjunto de parâmetros incluiria questões desde o número de eixos nos chassis dos carros até recomendações sobre o tipo de fiação e lâmpadas usados nos veículos.

— Mas, logicamente, é impossível fazer para este ano — defende Castanheira. — Estamos passando nossas experiências para os vários órgãos envolvidos, para chegarmos a modelos que promovam melhorias nas condições técnicas para a construção e a operação dos carros.

Em paralelo, o Ministério Público estadual, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, instaurou um inquérito civil em que foi elaborada a minuta de um Termo de Ajustamento de Conduta enviada aos bombeiros no último dia 14 de dezembro. Caso a corporação assine o TAC, a proposta é que os agentes realizem uma vistoria final em cada uma das alegorias das agremiações na armação dos desfiles, na Avenida Presidente Vargas, cerca de dez horas antes do início da apresentação de cada uma delas. O objetivo seria constatar se os carros atendem a normas técnicas de segurança. E, caso seja constatado algum problema, os bombeiros poderiam vedar a entrada da alegoria na Passarela.

Mas, como tem carnaval todo ano e não daria para esperar definições em cima da hora, a Unidos da Tijuca, por exemplo — que saiu da Passarela com 15 feridos em 2017, após parte de um de seus carros desabar em frente ao Setor 1 — resolveu abolir este ano os elevadores hidráulicos das alegorias. Segundo investigações da polícia, duas das quatro travas desse equipamento não teriam sido acionadas antes de a alegoria acidentada entrar na Avenida, causando o afundamento de um terceiro andar da estrutura.

Já na Paraíso do Tuiuti, cujo carro desgovernado matou a radialista Elizabeth Ferreira Jofre e deixou 20 feridos, também no Setor 1, comprará um bafômetro para impor uma Lei Seca aos motoristas de suas alegorias. E oferece a esses profissionais um curso de direção defensiva.

— Também estamos checando os antecedentes dos condutores, para sabermos se eles já se envolveram em algum acidente — afirma Ricardo Conceição, técnico de segurança do trabalho da azul e amarela.

Mesmo agremiações não envolvidas nos acidentes de 2017 têm tomado providências. A São Clemente resolveu cruzar a Avenida com todos os seus motoristas à mostra, valendo-se de uma interpretação do regulamento que a Liesa destacará para os jurados nos próximos dias: a de que não se deve tirar pontos das escolas que desfilarem com os condutores dos carros alegóricos aparentes.

Na Vila, o carnavalesco Paulo Barros submete todas suas ideias para os carros a sua equipe de engenheiros, e duas delas chegaram a ser barradas este ano.

Castanheira ressalta ainda que a Liesa está recolhendo das escolas, pela primeira vez, as fichas cadastrais de todos os motoristas de carros alegóricos.

Estão mantidas ainda as fiscalizações do Crea-RJ, que verificam se as escolas têm engenheiros responsáveis por sua produção. Já os bombeiros checam, na Cidade do Samba, se as alegorias contam com itens contra incêndio e pânico.

QUATRO RESPONDEM POR HOMICÍDIO CULPOSO

Se a criação de novos parâmetros de segurança para o carnaval não avançou, na Justiça o Ministério Público estadual ofereceu denúncia por homicídio culposo contra quatro envolvidos no acidente com a alegoria da Paraíso do Tuiuti. São acusados Francisco de Assis Lopes, motorista do carro; Jayme Benevides de Araújo Filho, diretor da alegoria; Edson Marcos Gaspar de Andrade, engenheiro da escola; e Leandro de Azevedo Machado, diretor de carnaval da azul e amarela.

Conhecendo as consequências lesivas que poderiam advir da condução do carro alegórico sem qualquer visibilidade para o condutor, os denunciados agiram de forma culposa ao não adotarem as providências necessárias a garantir a segurança do veículo”, diz a denúncia, recebida pelo Tribunal de Justiça no último dia 14 de dezembro.

O caso corre na 21ª Vara Criminal da capital. “Para o MP, o condutor do carro agiu com imprudência ao aceitar dirigir sem qualquer condição de visibilidade e desprovido de auxiliares externos que o orientassem. O diretor de alegoria também teria agido com imprudência, já que tinha sido alertado por Francisco da impossibilidade de enxergar a pista e, mesmo assim, autorizou que o veículo prosseguisse no desfile.”

Além disso, aponta o MP, Leandro agiu com negligência por ter “negado suporte ao diretor de alegoria, deixando de fornecer pessoas para guiar o veículo e equipamentos indispensáveis para minimizar as consequências de um possível acidente”. E o engenheiro Edson Marcos teria agido com imperícia ao orientar, supervisionar e aprovar a construção de uma alegoria sem condições de visibilidade para o condutor, não aplicando regras e técnicas de sua profissão

Crédito: Rafael Galdo/O Globo – disponível na internet 25/01/2018

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