A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que verbas de caráter alimentar pagas a mais por erro da administração não devem ser devolvidas quando recebidas de boa-fé pelo beneficiário. Os ministros mantiveram verba recebida há 20 anos por servidora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul que foi contestada durante processo de aposentaria.
Em ofício da universidade, a servidora foi informada de que a parcela correspondente às horas extras incorporadas durante o regime celetista seria suprimida dos seus proventos, por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), o qual exigiu ainda que os valores recebidos indevidamente fossem restituídos.
A servidora recorreu ao TCU alegando a ocorrência de decadência, violação ao princípio da segurança jurídica e a impossibilidade de reposição ao erário dos valores recebidos de boa-fé. No entanto, o TCU negou provimento ao pedido, e o caso foi para a Justiça.
Incabível
O Tribunal Regional Federal da 4ª região (TRF4) considerou incabível o desconto quando o equívoco resulta de erro administrativo e a quantia é recebida de boa-fé.
A universidade interpôs recurso especial no STJ, mas o relator, ministro Herman Benjamin, afirmou que o TRF4 decidiu de acordo com a jurisprudência, ao consignar que “não pode a administração retirar rubrica paga há mais de 20 anos à servidora, sob argumento de que a aposentadoria é ato complexo que só se perfectibiliza após o registro no Tribunal de Contas, quando o ato que manteve o pagamento da parcela é estranho à análise do cumprimento dos pressupostos da concessão da aposentadoria”.
Em seu voto, ele esclareceu que o STJ “vem decidindo, de forma reiterada, que verbas de caráter alimentar pagas a maior em face de conduta errônea da administração ou da má interpretação legal não devem ser devolvidas quando recebidas de boa-fé”.
Decadência
O ministro ressaltou que somente quando o processo de aposentadoria foi encaminhado ao TCU é que o pagamento referente às horas extras, reconhecidas em ação trabalhista, foi considerado ilegal.
“Transcorridos mais de 20 anos do primeiro pagamento da vantagem, e levando-se em conta que os prazos decadenciais, diferentemente do que ocorre com os prazos de prescrição, não são suscetíveis de suspensão ou interrupção, a conclusão que se tira é a da decadência do direito de a administração pública federal invalidar o ato administrativo que concedeu a vantagem”, considerou o relator, entendendo que estão preenchidos os requisitos estabelecidos no artigo 54 da Lei 9.784/99.
Herman Benjamin observou que o artigo 46 da Lei 8.112/90 prevê a possibilidade de reposição ao erário de pagamento feito indevidamente ao servidor público, após a prévia comunicação.
Contudo, ressaltou que essa regra “tem sido interpretada pela jurisprudência desta Corte Superior com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé, que acaba por impedir que valores pagos de forma indevida sejam devolvidos ao erário”.