O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou nesta terça-feira em Davos que a pobreza é o pior inimigo do meio ambiente, no mesmo dia em que o presidente Jair Bolsonaro anunciou a criação do Conselho da Amazônia e de uma Força Nacional Ambiental voltada à proteção ambiental e da floresta.
A declaração foi dada pela manhã, durante participação em painel no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, que discutiu as transformações e o futuro da indústria manufatureira.
“O pior inimigo do meio ambiente é a pobreza”, afirmou Guedes. “As pessoas destroem o meio ambiente porque elas precisam comer, elas têm outras preocupações que não são as preocupações das pessoas que já destruíram suas florestas e já combateram suas minorias étnicas e todas essas coisas.”
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, também ocupou o centro do palco no fórum nesta terça, quando evitou quase totalmente o assunto climático.
Guedes falou sobre o meio ambiente ao tratar do tema dos principais riscos e oportunidades para os negócios. Os demais participantes do painel —dois executivos e a presidente da Imperial College London— haviam levantado questões climáticas.
“Em um país como o Brasil estamos um pouco atrás, para não dizer muito atrás, então temos um primeiro nível de preocupações, que é eliminar um ambiente hostil para os negócios em geral, para receber, realocar todo esse conhecimento que já está disponível em todo o mundo”, afirmou Guedes, acrescentando que o governo está atuando para superar esses obstáculos.
Na quarta-feira, haverá um painel em Davos sobre como assegurar um futuro sustentável para a Amazônia, sem participação de representante do governo brasileiro.
Crédito: Isabel Versiani/Reuters Brasil – disponível na internet 22/01/2020
“As pessoas destroem o meio ambiente porque precisam comer”, diz Guedes
No Fórum Econômico Mundial de Davos, ministro da Economia afirma que “pior inimiga do meio ambiente é a pobreza” e destaca importância da reforma da Previdência e do ajuste fiscal. Desta vez, Bolsonaro não foi ao evento.
Em um painel do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse nesta terça-feira (21/01), que “a pior inimiga do meio ambiente é a pobreza”.
Sem meios de gerar renda, “as pessoas destroem o meio ambiente porque precisam comer e têm outras preocupações, que não são as de pessoas que já destruíram suas florestas”, disse o ministro. “É um problema muito complexo. Não há uma solução simples.”
No painel, cujo tema eram os avanços tecnológicos e o futuro da indústria, o ministro disse que o Brasil “está um pouco atrás, para não dizer muito atrás, nessa discussão”, mas que o tempo pode ser recuperado “se houver avanços em educação e tecnologia”. Ele defendeu a união entre pesquisa acadêmica e investimento privado na busca por inovações.
Mais tarde, em um debate sobre as perspectivas para a América Latina, Guedes declarou que o Brasil gasta “um Plano Marshall por ano” só com os juros da dívida, que, segundo ele, consomem R$ 400 bilhões anualmente. O Plano Marshall foi o principal plano dos Estados Unidos para a reconstrução de países aliados após a Segunda Guerra Mundial.
No contexto dos juros da dívida, Guedes destacou o ajuste fiscal promovido na atual gestão, a queda na taxa básica de juros e as reformas, pontuando que, diferentemente do que acontece na França, no Brasil a reforma da Previdência contou com o apoio popular.
Ao ser questionado pela plateia sobre as políticas para a juventude e para a desigualdade, Guedes falou que “a reforma da Previdência é para a juventude” e defendeu investimento “massivo” em educação básica.
Ao jornal Valor Econômico, Guedes confirmou que o Brasil permitirá que empresas estrangeiras participem de licitações públicas, e vai tentar aderir ao Acordo de Compras Governamentais (GPA, na sigla em inglês), que trata de forma isonômica companhias domésticas e de fora em aquisições do setor público. O GPA existe desde 1982, e conta com países como Estados Unidos e China entre seus signatários.
Durante o dia, o ministro tinha reuniões bilaterais agendadas com executivos dos bancos UBS e Itaú-Unibanco, além de encontros com representantes de companhias como Chevron, Microsoft, Visa e Arcelor Mittal.
O porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, informou no último dia 8 de janeiro que o presidente Jair Bolsonaro cancelou a ida ao evento em Davos, sem dar detalhes. O Fórum do ano passado marcou a estreia internacional de Bolsonaro, e sua participação acabou sendo encarada por analistas e observadores internacionais como uma oportunidade desperdiçada.
O Fórum Econômico Mundial, que anualmente reúne não apenas líderes mundiais, mas alguns dos principais nomes da indústria e das finanças do planeta, vai até sexta-feira.
Crédito: Deutsche Welle Brasil – disponível na internet 22/01/2020
O meio ambiente e os pobres – Leonardo Sakamoto
https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative – Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de “Pequenos Contos Para Começar o Dia” (2012), “O que Aprendi Sendo Xingado na Internet” (2016), entre outros.
VAMOS AO TEXTO:
Diante do frio em Davos, na Suíça, o ministro da Economia, Paulo Guedes, agasalhou-se em uma quentinha hipocrisia ao dizer que o grande inimigo do meio ambiente é a pobreza e que pessoas o destroem porque estão com fome. A declaração foi dada à nata global reunida no Fórum Econômico Mundial, na manhã desta terça (21) jan. 2020.
Faltou Guedes dizer quem alimenta a fome. Pois se a pobreza é causa, também é consequência. Não nasce de geração espontânea.
Dos indígenas que são expulsos de suas terras em nome da expansão agropecuária e incham favelas, como as de Dourados, no Mato Grosso do Sul, aos miseráveis que ocupam e poluem áreas de mananciais nas metrópoles, como São Paulo, por falta de alternativa de moradia, há sim uma relação entre pobreza e danos ao meio ambiente. Mas em praticamente todos os casos isso é explicado pela ausência do Estado em garantir qualidade de vida através de políticas públicas. Ausência, não, presença seletiva. Pois os mais ricos sempre contaram com a proteção e o apoio do Estado brasileiro.
Inclusive para desmatar, poluir o ar e a água e roubar e especular a terra em nome do lucro. A devastação ambiental no Brasil é fruto de um consórcio entre parte da elite econômica e o Estado brasileiro.
Enquanto ricos passaram relativamente incólumes à crise econômica, protegidos de taxas e impostos, a extrema pobreza atingiu 13,5 milhões de brasileiros em, 2018 – ou 6,5% da população, de acordo com a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE. O número subiu desde 2012, quando eram 5,8%. O instituto afirma que para reverter isso são necessárias políticas a fim de reduzir a vulnerabilidade social e criar empregos de qualidade. O ministro Guedes, contudo, acredita que a saída virá com o ajuste fiscal duro, o que reduz investimentos públicos. Isso é música para os ouvidos de Davos, mas ruído estridente para quem tem um prato vazio à sua frente.
Vale lembrar que Paulo Guedes foi defensor da proposta de aumentar a quantidade de anos que um trabalhador rural precisaria contribuir para se aposentar e a idade mínima que um idoso em situação de miséria deveria esperar a fim de receber um salário mínimo através do Benefício de Prestação Continuada – propostas que gerariam mais pobreza e só não passaram por conta de pressão da sociedade.Essa pobreza está diretamente relacionada ao modelo de desenvolvimento predatório que adotamos também. Modelo que não conseguimos mudar desde a ditadura militar e para o qual o ministro bate palmas. Crescer é sua meta, não importando quantos fiquem pelo caminho.
É impossível não se politizar a questão da fome por uma simples razão: ela, ao menos no Brasil, é fruto de decisões políticas e econômicas. Decisões que mantém a concentração de riqueza, de terra para plantar e de acesso aos alimentos nas mãos dos mais ricos. Enquanto que para a grande massa de esfarrapados, só resta rezar – o que, inclusive, é um excelente negócio para parte da bancada do fundamentalismo religioso, aliada de Bolsonaro… Uma pequena parte da população acaba sendo obrigada a poluir ou desmatar para sobreviver. Mas se tivesse estrutura e apoio financeiro, produziriam e preservariam o meio ambiente. As maiores taxas de preservação estão exatamente em territórios indígenas e em reservas extrativistas, com as populações tradicionais e os trabalhadores rurais cuidando dos recursos naturais. E não em latifúndios. Mas o Brasil expulsa quem preserva a terra para dar lugar a quem a desmata.Bolsonaro está rifando a qualidade de vida desta e das futuras gerações com o seu comportamento com relação ao meio ambiente. Para tanto, menospreza a ciência, enfraquece a fiscalização, difama populações tradicionais, abraça o naco anacrônico do agronegócio e deixa claro que o combate a crimes ambientais deixou de ser prioridade, enquanto apoia mudanças na legislação que fariam inveja à ditadura. Tudo isso aumenta a vulnerabilidade que, por sua vez, retroalimenta danos ao meio ambiente.
Precisamos construir uma opção de desenvolvimento que inclua o respeito às leis ambientais sem chance para anistias que criem a sensação de impunidade do “desmata aí, depois a gente perdoa”. Que passe pela regularização fundiária geral, confiscando as terras griladas e não premiando grileiros, e a realização de uma reforma agrária, com a garantia de que os recursos emprestados pelos governos às pequenas propriedades – as verdadeiras responsáveis por garantir o alimento na mesa dos brasileiros – sejam suficientes. Por reconhecer que as mudanças climáticas são uma realidade que vai expulsar milhões de suas terras e gerar fome. Por preservar os direitos das populações tradicionais, osassentados e de projetos extrativistas. Por manter o combate ao trabalho escravo e evitar o desmonte da proteção trabalhista no país.Isso faz lembrar uma citação atribuída ao já falecido Hélder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife, que lutou contra a ditadura e esteve sempre ao lado dos mais pobres: “Se falo dos famintos, todos me chamam de cristão, mas se falo das causas da fome, me chamam de comunista.”