Nova regra deve tirar geladeiras do mercado; ‘Só vão ficar as de mais de R$ 4 mil’, diz associação

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Imagem meramente ilustrativa (Foto: Marcos Cavalcante/UFU)

A partir de 2026, não poderão ser fabricadas ou importadas unidades com índice de eficiência abaixo de 90%; governo afirma que produtos fabricados aqui já atendem a essa norma

Uma decisão do governo federal, publicada no início do mês, promete tirar do mercado geladeiras ineficientes que não se encaixam nos critérios de eficiência energética — ou seja, com baixo consumo de energia elétrica. A medida causou mal-estar entre os fabricantes locais, que já enfrentam uma queda no volume de produção dois anos seguidos. O setor deve fechar 2023 com o segundo menor volume produzido nos últimos dez anos.

Pelo cronograma do governo, a partir de 1.º de janeiro, não poderão ser produzidas e importadas geladeiras com nível de eficiência energética abaixo de 85,5%. Esse índice sobe para 90% em 2026. A decisão, tomada pelo Comitê Gestor de Indicadores e Níveis de Eficiência Energética do Ministério de Minas e Energia (MME), acendeu o sinal de alerta para a indústria. A mudança de critério consta na Resolução n.º 2, de 23 de novembro de 2023, que foi publicada no Diário Oficial no dia 8 de dezembro.

Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), esse aperto pode retirar 10% dos volumes de geladeiras já no próximo ano e 83% em 2026, quando o índice de eficiência sobe para 90%. A produção de refrigeradores deve fechar este ano em 4,9 milhões de unidades.

O MME disse, por meio de nota, que o processo de definição dos novos índices de eficiência energética para as geladeiras “foi amplamente discutido, inclusive com a participação da Eletros, que não logrou êxito em apresentar dados que fundamentassem suas afirmações nas mais diversas oportunidades, seja em consultas públicas ou nas reuniões realizadas entre o Comitê Gestor de Indicadores e Níveis de Eficiência Energética do MME e representantes da associação”.

O presidente da Eletros, José Jorge do Nascimento, diz que “só vão ficar no mercado a partir de 2026 geladeiras com valor acima de R$ 4 mil e isso vai provocar um prejuízo gigante para a população das classes C, D e E”. Ele lembra que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a dizer, em meados do ano, que era preciso baratear o refrigerador para que os mais pobres pudessem trocar a geladeira. Na época, Lula fez alusão à cerveja “que não estava mais gelando”.

No entanto, ele ressalta que o setor foi surpreendido com a publicação da resolução no Diário Oficial neste mês. “Se o governo mantiver essa posição, inevitavelmente vai ter demissão.” A reportagem procurou Whirlpool, Electrolux e Esmaltec, as principais indústrias do setor para saber os impactos da medida na produção, mas não obteve resposta.

Posição do governo

De acordo com o Ministério de Minas e Energia, houve reuniões com a Eletros e o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, nas quais a associação reiterou suas preocupações com os prazos e os índices. No entanto, segundo o MME, a entidade “não apresentou novos dados que pudessem comprovar os impactos esperados pelas empresas”.

O ministério rebateu a informação da indústria de que, pelo menos a primeira fase de ajuste, que começa em 1.º de janeiro, retire produtos do mercado. “Todos os aparelhos atualmente fabricados e comercializados no País atendem ao índice de 85,5% definido para essa etapa”, diz a nota.

Em relação ao risco de aumento de preços das geladeiras por conta das novas exigências, o ministério argumenta que “experiências internacionais demonstram que a evolução de vários mercados têm aumento efetivo de eficiência sem alta de preços, e, em alguns casos, há inclusive redução.”

Em relação ao ponto levantado pela indústria de que serão retiradas as geladeiras mais baratas do mercado e que isso afetaria a população de menor renda, o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco), Bruno Hebert, ressalta que esse argumento não se sustenta do ponto de vista ambiental, energético nem econômico. “O drama da baixa renda é a conta de energia, e não adianta fazer um equipamento mais barato e ter uma conta de energia mais cara”, afirma.

Segundo o especialista, estudos mostram que o custo de aquisição de um equipamento elétrico é 4% do desembolso ao longo da vida útil do produto. A maior fatia, 96%, é o consumo de energia. “Com três a quatro anos, é possível pagar o valor total do refrigerador com a economia de energia”, observa.

Na opinião do presidente da Abesco, as indústrias que não se prepararam para esse momento de aumento da eficiência energética, que vem sendo discutido desde 2015, no âmbito do Acordo de Paris, vão ter de parar de fabricar esses produtos menos eficientes. A meta do País é melhorar em 10% a eficiência energética até 2030.

“Vemos a medida com bons olhos”, diz Hebert. Ele argumenta que a eficiência energética é o melhor caminho para o País, porque diminui investimentos com transmissão, distribuição. “Inclusive é o melhor caminho para a população de baixa renda.”

Momento crítico

Além das novas exigências de eficiência energética, o presidente da Eletros acrescenta o aumento da alíquota de importação sobre o aço, de 10,8% para 25%, pleiteado pelo setor siderúrgico, como fator de pressão. O aço responde pela metade do custo de produção da linha branca.

Nesse sentido, também está sendo observado pela indústria movimento semelhante no preço das resinas plásticas, matéria-prima de grande importância para a produção dos eletrodomésticos.

“Se o governo aceitar todas as medidas protecionistas aos insumos, o produto final vai ficar mais caro”, alerta o presidente da Eletros. Apesar da trajetória de queda da Selic, os juros fizeram um estrago nas vendas de eletrodomésticos da linha branca este ano. Pelo alto valor unitário, normalmente fogões, geladeiras e lavadoras são comprados a prazo.

Dados da Eletros mostram que 2023 termina com segundo menor volume de fogões, geladeiras e lavadoras produzidas dos últimos dez anos. São 12,9 milhões de unidades, um volume apenas 3,2% maior em relação a 2022, quando foram fabricados 12,5 milhões de eletrodomésticos. O ano passado foi o fundo poço para o setor. O pico do período ocorreu em 2012, com uma produção de 18.880 aparelhos. O resultado deste ano frustrou a expectativa, que era crescer entre 5% e 10% ante 2022.

Crédito: Márcia De Chiara /O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 18/12/2023

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